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O DNA dos Extintos
O DNA dos Extintos: embora ausentes há séculos ou milênios, muitas espécies permanecem com seu DNA em condições razoáveis. Graças aos avanços da genética, agora é possível reconstruir essas informações e decifrar capítulos perdidos da evolução. Assim, ciência e memória se entrelaçam em uma nova fronteira biológica. ![]() O DNA dos Extintos: decifrando o código das espécies perdidas31/7/2025 :: por Marco Pozzana, biólogo Em tempos recentes, a genética ultrapassou os limites do presente e passou a sondar os mistérios do passado. Através de tecnologias cada vez mais refinadas, cientistas vêm recuperando fragmentos de DNA de espécies extintas há centenas, milhares e, em casos surpreendentes, até milhões de anos. Assim, uma nova era da biologia ganha forma — em que fósseis, tecidos preservados e até fezes fossilizadas oferecem chaves para compreender o que foi perdido. ![]() Essa reconstrução genética tem início com o que se convencionou chamar de DNA antigo (ancient DNA ou aDNA). Extraído de ossos, dentes, cascos congelados ou fragmentos de tecido mumificado, esse material é quase sempre degradado. No entanto, avanços em sequenciamento de nova geração (NGS) tornaram possível decodificar mesmo fragmentos mínimos e contaminados, reconstruindo genomas com uma precisão antes inimaginável (Pääbo et al., 2004). Ainda assim, apesar do fascínio da ideia de trazer espécies extintas de volta à vida, a ressurreição de um organismo extinto permanece, na prática, impossível com a tecnologia atual. Mesmo com avanços notáveis na edição genética, recriar um ser vivo a partir de fragmentos de DNA antigos é extremamente limitado. Além disso, os aspectos epigenéticos, comportamentais e ecológicos — fundamentais para a sobrevivência e identidade de qualquer organismo — são irrecuperáveis. A espécie, portanto, pode ser parcialmente imitada, mas jamais plenamente restaurada. O que se obtém, no máximo, é um híbrido genético aproximado, distante do original em sua complexidade biológica e histórica. Reconstruindo a genética de espécies desaparecidasUm dos casos mais emblemáticos desse campo foi o sequenciamento do genoma do mamute-lanoso (Mammuthus primigenius). Encontrados em regiões do Ártico, os restos congelados dessa megafauna permitiram a recuperação de quase todo seu material genético. Comparações com o DNA do elefante asiático revelaram não apenas proximidade evolutiva, mas também adaptações moleculares ao frio, como proteínas específicas e genes reguladores de gordura marrom (Lynch et al., 2015). Além disso, o genoma do Homo neanderthalensis também foi sequenciado com sucesso. Graças aos trabalhos pioneiros de Svante Pääbo e sua equipe, foi possível identificar segmentos do DNA neandertal presentes nos humanos modernos, especialmente em populações da Europa e da Ásia. Assim, descobriu-se que o legado genético da extinção nem sempre representa desaparecimento completo — mas sim transformação (Green et al., 2010).
ARQUEOGENÉTICA: DESVENDANDO O PASSADO PELA HERANÇA MOLECULARPor outro lado, nem todos os projetos visam apenas o conhecimento evolutivo. A chamada “desextinção” tornou-se um tema polêmico e fascinante. Pesquisadores da área de biologia sintética tentam, por exemplo, recriar genes extintos e inseri-los em espécies vivas aparentadas. Essa estratégia já está em curso com o tilacino (Thylacinus cynocephalus), também conhecido como tigre-da-tasmânia, extinto na década de 1930. Com fragmentos de DNA recuperados de espécimes preservados em museus, cientistas australianos buscam recriar funções genéticas perdidas (Feigin et al., 2018). ![]() Tigre-da-tasmânia, lobo-da-tasmânia ou tilacino (Thylacinus cynocephalus) Contudo, o projeto mais ambicioso é, sem dúvida, o do mamute-lanoso, cuja “ressurreição” simbólica vem sendo tentada através da inserção de genes específicos em embriões de elefantes asiáticos. A meta não é apenas reviver um animal extinto, mas criar um híbrido adaptado ao frio que possa repovoar as tundras e ajudar a combater o derretimento do permafrost — uma proposta controversa, mas ambientalmente visionária (Church & Regis, 2012). Do ponto de vista técnico, essas tentativas enfrentam inúmeros obstáculos. A degradação do DNA, a dificuldade de encontrar espécies hospedeiras compatíveis e os limites éticos da manipulação genética impõem desafios contínuos. Além disso, há o risco de produzir organismos inviáveis ou com sofrimento biológico, o que exige um cuidado rigoroso em cada etapa experimental. Mesmo assim, as possibilidades oferecidas por esse campo são vastas. O estudo do DNA de aves moa, por exemplo, permitiu reconstruir parte da biogeografia da Nova Zelândia antes da chegada humana. Igualmente, a análise do genoma do dodo (Raphus cucullatus) oferece insights sobre evolução insular, perda de voo e vulnerabilidade ecológica. Em todos os casos, reconstruir o passado ilumina o presente e pode ajudar a proteger o futuro. DNA FANTASMA: RASTROS GENÉTICOS DE ANIMAIS EXTINTOS![]() Os Últimos Gigantes. Decifrando o código perdido das espécies perdidas Não por acaso, museus e coleções biológicas ganharam nova importância. Espécimes preservados há mais de um século, antes considerados apenas relíquias, tornaram-se fontes preciosas de informação genômica. Desse modo, a genética uniu-se à taxonomia clássica, criando uma nova aliança entre o passado e o presente da biologia.
Curiosamente, até fósseis de espécies extintas há milhões de anos podem conter traços de proteínas ou microfragmentos de DNA. Embora o limite teórico de preservação do DNA seja de cerca de um milhão de anos, achados recentes desafiam essa estimativa. Em cavernas frias da Sibéria e da Groenlândia, sedimentos revelaram material genético de musgos, líquens e animais datados de até dois milhões de anos (Kjaer et al., 2022). No entanto, a reconstrução genética não deve ser vista como solução para a atual crise de extinção. Espécies que desaparecem hoje deixam lacunas ecológicas, genéticas e simbólicas difíceis de restaurar. Portanto, embora a genética permita vislumbrar retornos impressionantes, o verdadeiro desafio continua sendo a conservação do que ainda existe. Em síntese, o DNA dos extintos não nos serve apenas para reviver o passado. Ele também nos alerta para os efeitos do desaparecimento, nos conecta a linhagens perdidas e amplia o entendimento sobre a vida em sua plenitude. Cada fragmento recuperado é um fio de memória, um pedaço de história e um lembrete eloquente de que, no grande livro da evolução, muitas páginas ainda podem ser lidas — mas nunca reescritas. Fontes e referências:
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| Folha de S.Paulo - 01/08/2025 | ||||||||||||||||||||||
| Estado de Minas - 01/08/2025 | ||||||||||||||||||||||
| Jornal O Tempo - 01/08/2025 | ||||||||||||||||||||||
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