20 outubro, 2024

Ponte Jornalismo

Cláudio Justiniano de Sousa foi um médico, escritor, dramaturgo e orador brasileiro. Wikipédia
Nascimento: 20 de outubro de 1876
Falecimento: 28 de junho de 1954, Rio de Janeiro, Rio de Janeiro


A dor e a Resistência das mães que perderam tudo

Sandra de Jesus Barbosa da Silva segura faixa do Movimento Mães de Maio durante cortejo do Bloco Afro Ilú Obá De Min, em fevereiro. Data marcou um ano da morte de Luiz Fernando. | Foto: Daniel Arroyo/Ponte Jornalismo

Desde que entrei na Ponte, vejo mães de vítimas da violência na luta por justiça para os filhos que jamais verão de novo. Transformam o luto em luta, integram movimentos sociais, denunciam a violência do Estado. Em sua maioria, são mulheres negras que precisam ser ainda mais fortes, afinal fomos criadas para  ser inquebrantáveis. Essas mães são incríveis, exemplos, heroínas… só que há um componente que, por vezes, pode nos escapar. Essas mulheres são humanas. Sentem dores inimagináveis, têm a vida interrompida e virada de ponta-cabeça. Perdem estabilidade financeira, lar, apoio da família. Tudo porque a polícia matou seus filhos. 


Essas mulheres nunca pediram para virar referências de luta. Foi a violência genocida que as impeliu a pressionar as autoridades para que a justiça seja feita. Esta é uma consequência direta do extermínio de jovens negros que o Estado brasileiro é especialista em praticar, independentemente se o governo de turno está à esquerda ou à direita. 


Há um elemento de fragilidade humana escondido por trás do punho erguido dessas mulheres. Há um coração ferido no grito. Há vigilia que não acaba. Há o rememorar, o espaço vazio que ficou. Por trás da armadura, existe uma mulher que é forçada a engolir a vulnerabilidade e a dor para tentar construir um mundo onde não aconteça com outros filhos o que se passou com os seus. Construir um caminho de justiça aos filhos mortos. 


“Fiquei sem saber o que dizer”, disse minha colega de Ponte, a repórter Jeniffer Mendonça, em uma reunião de pauta desta semana. Ela havia entrevistado Sandra de Jesus Barbosa da Silva, mãe de Luiz Fernando Alves de Jesus, morto pela polícia em 2023. “Eu nunca mais vou conseguir ser a Sandra que fui antes.” Foi o que Jen ouviu desta mãe. O que dizer para esta mulher que sabe que o filho escolheu um caminho errado, mas também sabe que ele deveria ter passado pelos ritos legais de investigação e julgamento? 


Nem sempre temos o que dizer, mesmo trabalhando com a palavra diariamente. Ela nos falta em um momento como esse, nos deixando impotentes. Entretanto, é a palavra que a Ponte usa como ferramenta para registrar a história desses filhos. Tirá-los do estereótipo de suspeitos e passar a dizer seus nomes, lembrar de sua humanidade, de seus sonhos, como foi sua passagem pelo mundo e como lhes foi roubado o direito a um julgamento, a uma vida nova talvez. 


Ponte não esquece. Como muitos outros, acompanhamos o caso de Luiz Fernando desde o ano passado. Se à época sua história ganhou as páginas dos principais veículos, hoje reina o silêncio retumbante de nossos colegas da grande imprensa. Porque o que vale é o clique, a audiência, a assinatura, a publicidade. São outros os compromissos. E, que fique bem claro, todo veículo pode ter suas fontes de receita para se manter. 


Mas é possível ter compromisso com os direitos humanos e uma posição de denúncia da violência do Estado e ter fonte de receita para se manter. A Ponte faz isso. E com o apoio dos leitores continuará fazendo até o glorioso dia em que não haja violência. Enquanto isso não acontece, estaremos ao lado das mães, usando o jornalismo para pressionar o poder público a se manter no caminho da justiça. 


Esta é a forma com que buscamos dar suporte a essas mães. Usando o jornalismo como ferramenta de denúncia e de visibilização. Para que seus gritos e dores não caiam no esquecimento. 

DESTAQUES

Com criança fardada e viatura Camaro, feira romantiza violência policial


‘Quero sair de Itu’, diz familiar de vítima após eleição de líder do ‘Bonde do Moacir


‘A PM não deu uma segunda chance para o meu filho’, diz mãe de jovem negro morto pela Rota


Brasil precisa de política nacional para regular polícias, diz ONU 


Artigo | Vidas que não atraem cliques


PMs da Rota defendidos por Derrite são acusados de executar jovem negro


Foto de moto é única prova que mantém jovem negro preso por homicídio na Bahia

PONTE DE ONTEM

Esta semana, a imprensa publicou a morte de Aristides Mathias Flach Braga durante uma briga. Em 2021, a Ponte apresentou mensagens nas quais o filho de um comissário de polícia aposentado da Polícia Civil do Rio Grande do Sul ameaçou de forma racista o ativista Antonio Isuperio. Na época, ele teria dito:  “a gente vai te achar e o que a gente vai fazer contigo é do tamanho do patamar de aqueles vídeos dos chilenos cortando a cabeça dos caras”. Além disso, afirmou que os que “odeiam judeus” iriam atrás dele. Ao ser questionado pela Ponte, o pai de Aristides disse: “Não faz sentido, ele é negão, eu sou negão”.

POR AÍ

Câmera corporal registra quando PM atira em homem com marreta em surto psicótico na Zona Sul de SP (G1, 17/10)


Comissão do Senado aprova porte de arma para oficiais de justiça e agentes socioeducativos (Alma Preta, 17/10)


“Estamos em perigo”: diz na ONU neto de Mãe Bernadete, quilombola assassinada na Bahia (Agência Pública, 17/10)


Um manual que todos os policiais, promotores e juízes devem ler e cumprir  (Agência Pública, 16/10)


PM não descarta que “salve do PCC” seja obra de agentes penitenciários (Metrópoles, 16/10)


PM entra em alerta para possível ação do PCC após ataques a policiais em Guarujá (Folha de S. Paulo, 15/10)

VAI LÁ

O livro A Filha Perdida, da escritora italiana Elena Ferrante, conquistou o mundo com a história da mulher sofisticada que abandona suas duas filhas pequenas para viver sua própria vida. A história ganha sua primeira montagem para os palcos brasileiros. O espetáculo A Filha Perdida conta a história de Leda, uma professora universitária e tradutora bem-sucedidaque decide passar as férias sozinha em um balneário onde se vê obrigada a encarar o passado. As atrizes Juliana Araújo – também autora da dramaturgia – e Maristela Chelala dividem o palco com o ator e músico Alex Huszar, autor da trilha sonora do espetáculo que, além de interpretar os personagens masculinos, executa a trilha ao vivo. A peça está em cartaz no Teatro Cacilda Becker (R. Tito, 295 - Lapa, São Paulo) de 23 a 26 de outubro, às 21h (de quarta a sábado) e os ingressos são gratuitos, podendo ser retirados uma hora antes do espetáculo. 

Cidad3: Imprensa Livre!!!