Na guerra às drogas que se supõe que as polícias travam há décadas milhares foram mortos, outros milhares encarcerados. Mas qual foi o resultado? Há menos droga circulando? Há menos armamento ilegal na mão de facções? Você sabe a resposta dessa pergunta, .
Ao longo de todo esse tempo, os investimentos em policiamento ostensivo e segurança pública só cresceram, sem que tivéssemos resultados visíveis: continuamos inseguros, as facções ampliaram seus negócios e armas ilegais circulam mais livremente por aí.
Uma moradora da favela do Siri, em Florianópolis, disse uma das frases mais assertivas que já li sobre o tema: “Só que isso não é pela droga, é para exterminar. Aqui no Norte da ilha só tem uma entrada: como que a gente passa sufoco na temporada [de verão] com o fluxo de carro, tudo trancado, um caos, e eles não conseguem controlar a droga que entra?”. No território, há o medo e a revolta: no último final de semana, a PM-SC fez a terceira execução em menos de três anos. Natanael França de Assis tirava uma selfie para a namorada quando foi morto por policiais. Como é de praxe, a alegação foi de confronto. A polícia não fez nenhuma apreensão de drogas ou armas com o rapaz de 19 anos.
Em Piracicaba, interior de SP, Gabriel Junior Oliveira Alves da Silva morreu ao defender a esposa grávida de 8 meses de uma agressão policial. Não foi encontrado nem arma nem drogas com ele. Na delegacia, os PMs alegaram que abordaram Gabriel por ter um volume suspeito e que atiraram em legítima defesa porque o jovem os teria ameaçado com… uma pedra ao ver um dos policiais puxando o cabelo da esposa. Só que um laudo obtido em primeira mão pela Ponte provou que o disparo foi por trás, perto da nuca.
Ambos os casos aconteceram em bairros nos quais políticas públicas são raridades ou mesmo nulidades. Afinal, temos estados, como São Paulo, que investem mais na secretaria de segurança pública (R$ 20 bilhões, sendo R$ 12 bilhões para a PM) do que em desenvolvimento econômico (R$ 376 milhões), cultura (R$ 1,4 bilhão), esportes (R$ 419 mi), habitação (R$ 3 bi), agricultura (R$ 1 bi), turismo (R$ 734 mi), políticas para mulher (R$ 36 mi) e para as pessoas com deficiência (R$ 72 mi), meio ambiente e infraestrutura (R$ 10,9 bi). Todos esses valores somados ficam abaixo do orçamento da SSP.
Os números foram levantados pelo Instituto Direito à Memória e Justiça Racial (IDMJR) no estudo Dossiê Orçamentário que avaliou as propostas orçamentárias dos Estados de São Paulo, Rio de Janeiro e Espírito Santo.
Serão R$ 42 bilhões somados desses três Estados destinados a uma guerra onde quem está perdendo é a população preta e favelada deste país e quem ganha é o tráfico e os políticos que assanham uma base política ao defender a morte como prática de segurança pública.
É um conflito em que o inimigo são corpos elimináveis, meros “CPFs” e não importa se não tinham drogas, nem armas, nem ligação com o crime. Afinal, como tem muita gente que pensa, se a polícia parou, abordou e matou é porque alguma coisa a pessoa fez.
Qual é a prioridade deste país? Investir em saúde, educação, habitação, qualidade de vida ou meter polícias tresloucadas nas periferias, favelas, tribos e quilombos do Brasil? Os números falam melhor do que eu sobre qual é a perspectiva dos nossos governos, independentemente do lado político. A lógica adotada para segurança pública é a da guerra, uma que se “luta” há tanto tempo, mas que o resultado é gente preta morta ou na cadeia.