A gente já mostrou por aqui como o acúmulo de penduricalhos fez a remuneração de juízes, promotores e procuradores explodir nos últimos anos e ultrapassar os ganhos dos ministros do STF, os que deveriam ser os mais bem remunerados do Brasil.
Nesta semana, a gente dá um passo atrás para contar como chegamos a esse ponto.
O UOL explica em detalhes a maneira pela qual nascem e se multiplicam os penduricalhos nas cortes dos país e como esse sistema transformou o Brasil numa das nações com o Judiciário mais caro do mundo.
Embarque numa viagem por dentro do mundo jurídico dos adicionais, bônus e outros benefícios. Mas não se preocupe, a gente vai de guia e explica tudo de forma bem didática.
As paradas desta semana para entender esses privilégios são:
Como os penduricalhos nascem e se multiplicam
Os chamados "penduricalhos" são benefícios extras pagos a servidores públicos, principalmente do Judiciário, que engordam salários e muitas vezes ficam fora do teto constitucional. Em 2023, havia 2.669 rubricas diferentes só no Judiciário, criadas por decisões administrativas sem passar pelo Congresso. Esses penduricalhos surgem de pressões das categorias por novos benefícios e da insatisfação com salários, sendo replicados por outros órgãos após aprovação inicial, num efeito cascata. Conselhos como CNJ e CNMP, formados em sua maioria por integrantes dessas próprias carreiras, avalizam os novos benefícios, que se espalham entre tribunais e Ministérios Públicos. Com isso, milhares de trabalhadores da elite dos servidores púbicos do Brasil -a maioria, juízes e desembargadores- recebem supersalários, somando R$ 13 bilhões por ano em gastos extras.
Por que o nosso Judiciário é o mais caro do mundo
O Judiciário brasileiro é um dos mais caros do mundo, com gastos de 1,2% do PIB em 2023, frente à média global de 0,4%. Cerca de 90% do orçamento é destinado a salários e benefícios de servidores, com juízes recebendo, em média, R$ 68 mil por mês, valor inflado por penduricalhos — auxílios e indenizações que driblam o teto constitucional. Além dos altos custos com pessoal, o sistema enfrenta sobrecarga crônica: há 80 milhões de processos em curso, sendo 40% deles movidos pelo próprio Estado para cobrar ou postergar pagamentos. Essa combinação de privilégios, excesso de litígios estatais e morosidade estrutural explica por que o Judiciário brasileiro consome mais recursos do que sistemas de outros países.
Juízes já ganham mais em adicionais do que com o salário
Juízes e desembargadores brasileiros receberam, em 2024, mais em penduricalhos e adicionais do que no próprio salário-base pela primeira vez. Esses penduricalhos — auxílios e bônus criados por atos administrativos — driblam o teto constitucional e são isentos de Imposto de Renda. Em 2024, os extras somaram R$ 7 bilhões, enquanto os salários somaram R$ 5,4 bilhões. Entre os penduricalhos, a licença compensatória, que remunera acúmulo de funções, é um dos principais fatores de aumento nos contracheques. Essa prática tornou-se mais vantajosa do que pedir reajustes salariais, já que aumentos exigem aprovação do Congresso. Comparados aos EUA, juízes brasileiros ganham, em média, 46% a mais, apesar de o Brasil ser um país de renda média. Economistas apontam que a criação e ampliação desses privilégios aprofundam a desigualdade e ferem o princípio constitucional do teto salarial.
Volta de privilégio extinto há duas décadas faz juízes ganharem R$ 1 milhão
Em fevereiro de 2024, dez juízes de Rondônia receberam pagamentos superiores a R$ 1 milhão cada, graças à volta do quinquênio, extinto pelo CNJ em 2006. Esse adicional por tempo de serviço, pago a cada cinco anos, foi retomado após decisões favoráveis da Justiça e do STF, beneficiando juízes que ingressaram antes de 2006. O pagamento retroativo corrigido pela inflação resultou em cifras milionárias. O CNJ e o TCU tentaram barrar o benefício, mas foram derrotados. Tribunais de todo o país voltaram a pagar o quinquênio, gerando um impacto bilionário. Uma PEC no Senado quer ampliar o benefício para juízes, promotores, procuradores e outras categorias. Se aprovada, a medida custará R$ 42 bilhões.
Corte militar tem bônus por sessão, vôo em executiva e diárias de US$ 1.000
Magistrados do Superior Tribunal Militar (STM) recebem bônus de até um terço do salário por participarem de sessões administrativas presenciais ou virtuais e por integrarem comissões ou projetos. Além disso, têm direito a voar em classe executiva, duas férias por ano, auxílio pré-escola e diárias de quase US$ 1.000 em viagens internacionais. Em dezembro de 2024, os pagamentos aos ministros variaram entre R$ 263 mil e R$ 350 mil, com licenças compensatórias e outros penduricalhos inflando os ganhos. Esses benefícios escapam do teto constitucional e incluem folgas extras que podem ser vendidas. A Justiça Militar argumenta que segue normas do Judiciário, mas especialistas apontam manobras para burlar o teto salarial. Em 2024, o orçamento da Justiça Militar foi de R$ 760 milhões, sendo 74% para folha de pagamento.
E não deixe de acompanhar os próximas destinos da série que desvenda os privilégios de alguns grupos, em detrimento de outros.
Eles ficarão listados nesta página.