Distribuição de recursos mudou sob secretário, e Artplan aumentou receita em 36%; há equilíbrio, diz governo
Fabio Wajngarten e Bolsonaro
Fábio Fabrini e Julio Wiziack - Folha.com
A
agência de publicidade Artplan, cliente de uma empresa privada do chefe
da Secom (Secretaria de Comunicação Social da Presidência da
República), Fabio Wajngarten, passou na gestão dele a ser a número um em
verbas distribuídas pela pasta.
Sob
o comando de Wajngarten, a agência recebeu da secretaria R$ 70 milhões
entre 12 de abril e 31 de dezembro de 2019, 36% mais do que o pago no
mesmo período do ano anterior (R$ 51,5 milhões).
O
levantamento feito pela Folha nas planilhas de pagamento da Secom
mostra uma inversão de tendência. Até a chegada de Wajngarten ao cargo
de secretário, a agência mais contemplada com a verba de propaganda era a
Calia Y2.
No
mesmo intervalo de tempo em 2019, ela obteve R$ 57,1 milhões, quase 40%
menos que em 2018 (R$ 92,6 milhões), no governo Michel Temer (MDB).
Líder em receitas da Secom até aquele momento, a Calia Y2 pertence ao
irmão de Elsinho Mouco, marqueteiro do ex-presidente. Ele não tinha
cargo na comunicação do governo, mas era um conselheiro para essa área.
Mesmo
em 2019, antes da nomeação de Wajngarten, a Calia Y2 ainda era a que
mais recebia da secretaria. Até 11 de abril, véspera de ele assumir, a
agência obteve R$ 43,8 milhões, ante R$ 15,4 milhões da Artplan. Depois
disso, a dinâmica dos pagamentos mudou.
Como
revelou a Folha na quarta (15), o chefe da Secom é sócio da FW
Comunicação, que recebe dinheiro de emissoras de TV (como Record e Band)
e agências contratadas pela pasta, ministérios e estatais do governo
Bolsonaro.
A
Artplan é uma das contratantes da FW, ao mesmo tempo em que detém a
conta de propaganda da secretaria vinculada à Presidência e de outros
órgãos do Executivo federal.
A
FW faz checking para a agência e outras duas detentoras da conta de
publicidade da Caixa. O serviço consiste em averiguar se anúncios
comprados pelo banco foram efetivamente veiculados.
Como
secretário, Wajngarten assinou em agosto do ano passado um aditivo de
R$ 127 milhões e prorrogou o contrato da Artplan com a Secom.
Questionado
pela Folha, ele ainda não apresentou a lista completa de contratantes
de sua empresa, tampouco os valores que cada uma paga.
Hoje,
três agências detêm a conta da pasta. Além da Artplan e da Calia, a
PPR, cujo nome fantasia é NBS, faz ações de publicidade demandadas pela
equipe de Wajngarten.
Por
lei, sempre que um órgão público encomenda uma campanha, as contratadas
apresentam suas propostas e passam por seleção interna. A que mais
atende aos requisitos do concurso presta o serviço.
A
disputa é regida por um manual da Secom. Quando o investimento é
superior a R$ 5 milhões, o processo é conduzido por uma comissão de
avaliação, que aponta os projetos mais condizentes com a demanda do
governo. A decisão final é do chefe da Secom.
Três
executivos de agências ouvidos nos últimos dias pela Folha explicaram
que alguns dos critérios são subjetivos, como os de originalidade e de
criatividade das peças.
Sob
Wajngarten, a Artplan executou as ações prioritárias da Secom em 2019.
Propagandeou a reforma da Previdência e as medidas anticrime, bandeira
do ministro da Justiça, Sergio Moro.
A
campanha da reforma, a mais cara, foi aprovada em fevereiro, na gestão
do ex-chefe da Secom Floriano Amorim e do então ministro da Secretaria
de Governo, general Carlos Alberto dos Santos Cruz.
Segundo gestores da Secom, os dois e outras autoridades do Planalto resistiam, na época, a pôr a campanha na praça.
Havia
orientação da Presidência para segurar os recursos para as ações
publicitárias. Os contratos passavam por um pente-fino. Algumas
autoridades sustentavam que mensagens do presidente em redes sociais
dariam mais resultado que ações publicitárias.
A
campanha só destravou quando Wajngarten assumiu. Na gestão dele, foram
aprovados 2.229 pagamentos para as ações da Nova Previdência, contra 32
antes disso. E 84% do montante pago nessas ações publicitárias (R$ 53
milhões) tiveram aval para desembolso a partir de junho.
Os
valores repassados pela Secom incluem o que as agências recebem e
transferem aos veículos de mídia. Sobre o montante dos anúncios, elas
ficam com 15%.
Wajngarten
tem 95% das cotas da FW e, conforme o estatuto social da empresa,
recebe lucros e dividendos na proporção de sua participação. A mãe dele
tem os outros 5%.
Antes
de assumir a Secom, o secretário passou a função de administrador da FW
para o empresário Fabio Liberman. Depois disso, escolheu para ser seu
adjunto na pasta o irmão dele, Samy Liberman, que participa das decisões
sobre a distribuição da verba publicitária.
A
legislação vigente proíbe integrantes da cúpula do governo de manter
negócios com pessoas físicas ou jurídicas que possam ser afetadas por
suas decisões. A prática implica conflito de interesses e pode
configurar ato de improbidade administrativa. Entre as penalidades
previstas está a demissão.
A
lei proíbe o agente público de exercer atividade que implique a
prestação de serviços ou a manutenção de relação de negócio com empresas
com interesse nas suas decisões. Também veda que o ocupante de cargo no
Executivo pratique ato em benefício de pessoa jurídica de que participe
ele próprio, seu cônjuge, companheiro ou parentes até o terceiro grau,
ou mesmo que possa ser por ele beneficiada ou influenciar seus atos de
gestão.
A
Comissão de Ética Pública da Presidência, que fiscaliza situações de
conflito de interesses, informou que o caso de Wajngarten será avaliado
no dia 28. O TCU (Tribunal de Contas da União) também o discutirá em
plenário.
O secretário nega irregularidades e diz que os contratos com as empresas foram firmados antes de assumir o cargo na Secom.
COMUNICAÇÃO DO GOVERNO
Quem é Fabio Wajngarten?
Publicitário, assumiu a chefia da Secretaria de Comunicação Social da Presidência da República (Secom) em abril de 2019
O que faz a Secom?
Entre
outros papéis, é responsável pela distribuição da verba de propaganda
do Planalto e dita as regras para as contas dos demais órgãos federais
Qual a polêmica envolvendo o secretário?
Como
mostrou a Folha, Wajngarten recebe, por meio de uma empresa da qual é
sócio, dinheiro de emissoras de TV e de agências de publicidade
contratadas pela própria secretaria, ministérios e estatais do governo
Jair Bolsonaro; desde que assumiu o cargo, teve pelo menos 67 reuniões
com representantes de clientes e ex-clientes de sua empresa.
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