As eleições americanas são horríveis. Isso é intencional.
Você pode ser perdoado por não entender por que, na próxima terça-feira, os Estados Unidos usarão o colégio eleitoral, uma série de disputas em que o vencedor em cada estado leva tudo, para determinar o resultado de sua eleição presidencial, em vez da contagem nacional. A candidata com milhões de votos a mais pode, de fato, perder a corrida, como aconteceu com Hillary Clinton em 2016.
Você tem razão em ficar confuso sobre como os valores democráticos são promovidos pelo fato de o dia da eleição ser em uma terça-feira que nem é feriado nacional.
Você não seria o único a ficar chocado com o fato de que cada cidadão precisa se registrar com muita antecedência para poder votar. Nem de que, a cada quatro anos, surge uma onda de notícias sobre tentativas indecorosas dos republicanos de invalidar os registros de centenas de milhares de eleitores, intimidá-los com ameaças de multas ou prisão se cometerem um erro ou, de várias formas inovadoras, alterar as regras do jogo no último minuto.
E, embora a lei federal proíba a remoção em massa de eleitores a menos de 90 dias das eleições, esta semana, apenas sete dias antes da eleição, a Suprema Corte, dominada por republicanos radicais e ideológicos, decidiu que o governador republicano da Virgínia poderia fazer exatamente isso. Autoridades estaduais e do partido republicano alinhadas a Trump também tentaram truques sorrateiros nos estados do Alabama, Geórgia, Nebraska, Carolina do Norte, Michigan, Arizona, Nevada e além.
Enquanto essa sujeira virou o novo normal, este ano, no entanto, a tensão está maior do que nunca, pois Trump ainda se recusa a aceitar que perdeu em 2020 e alguns de seus apoiadores mais fervorosos, que estão remoendo essa mentira há quatro anos, estão prontos para causar um inferno se a eleição for novamente “roubada” dele. Isso traz outra dimensão, muito mais medonha, ao jogo do roubo eleitoral, fazendo com que muitos mesários de longa data desistissem por medo de violência.
Olha, a “maior democracia do mundo” (alguém ainda acredita nisso?) foi projetada desde o início para ser antidemocrática. James Madison, o “pai da Constituição”, reverenciado por ambos os partidos, escreveu de forma célebre que o sistema de governo que ele e seus amigos da elite projetaram serviria para evitar “a tirania da maioria” – que é como as pessoas ricas e eruditas da época aparentemente se referiam à “democracia”.
Os tribunais, o sistema eleitoral, o Senado – tudo foi criado para frear a vontade popular e proteger os interesses dos donos do poder. Madison escreveu a Constituição em uma época em que as elites estavam assustadas com as revoltas populares de fazendeiros pobres e veteranos militares descontentes com a crescente desigualdade, a ganância da elite e uma crise de dívida que estava fazendo com que pessoas normais perdessem suas fazendas para banqueiros e comerciantes. Eles sabiam que isso era injusto e exigiram sua fatia da prosperidade que o novo país havia prometido.
Atualmente, os Estados Unidos enfrentam níveis de desigualdade maiores do que os registrados durante a “Era Dourada” dos “barões ladrões” do início do século 20, que levou à Grande Depressão. Portanto, não é de surpreender que a elite política e econômica esteja novamente inovando em maneiras de reprimir a democracia.
Algumas das piores derrotas vieram de juízes nomeados pelos republicanos nos tribunais, incluindo a infame decisão Citizens United de 2010, que efetivamente removeu os limites dos gastos de bilionários e empresas para influenciar campanhas – que podem ser feitas sem revelar quem pagou o quê – sob o argumento da liberdade de expressão. (Liberdade para os ricos, mas os outros que se danem, para variar.)
O Open Secrets, um grupo que monitora a corrupção legalizada de Washington, estima que R$ 92 bilhões serão gastos neste ciclo eleitoral, o mais caro da história.