Segundo o MPSP, para a configuração deste delito é necessário que o agente se conduza de má-fé.
Por Giselle Souza
O
vídeo do grupo humorístico Porta dos Fundos que faz paródia de
passagens bíblicas não demonstra a intenção de ofender qualquer
religião. Seguindo esse entendimento, a Vara do Juizado Especial do
Fórum da Barra Funda, em São Paulo, determinou o arquivamento do
processo que acusava os humoristas de cometer “ultraje a culto e
impedimento ou perturbação de ato a ele relativo” — crime previsto no
artigo 208 do Código Penal.
Após a divulgação do vídeo
“Especial de Natal”, em dezembro de 2013, o deputado federal Marco
Feliciano (PSC-SP) representou o grupo ao Ministério Público. Ele
argumentou que 80% da população brasileira é cristã e que o cristianismo
está “intrinsecamente ligado à manifestação cultural da religiosidade
nas tradições brasileiras”.
A questão foi parar na 2ª
Delegacia de Polícia de Repressão aos crimes raciais e de delitos de
intolerância, que instaurou inquérito para apurar a ocorrência de crime.
O grupo foi representado pelo advogado Alexandre Fidalgo. “Defendemos
que o humor constitui exercício do direito constitucional de liberdade
de expressão, que no Direito brasileiro é galgado a um direito
fundamental, pressuposto de uma efetiva democracia. Além disso, a
jocosidade, o humor, a graça, a paródia retiram qualquer elemento
volitiva do tipo penal indicado, além do que afasta qualquer ideia de
intenção de agredir sentimento religioso”, afirma o advogado.
A
delegada do caso, Daniela Branco, remeteu à conclusão do inquérito ao
Ministério Público de São Paulo, que apresentou à denúncia ao Juizado
Especial Criminal. Mas o parquet acolheu a tese da defesa e opinou pelo arquivamento do processo – o que foi atendido pelo juiz José Zoega Coelho.
“Com
efeito, os elementos e indícios carreados aos autos não estão a ensejar
a propositura de ação penal. Não é possível extrair das cenas e frases
dos personagens a intenção de ofender a Igreja ou culto religioso. Como é
cediço, para a configuração deste delito é necessário que o agente se
conduza de ma-fé (…). Não vislumbro essa intenção no caso narrado. Ainda
que os autores tenham agido com falta de cortesia (…) isso não pode,
por si só, configurar o crime do artigo 208 do Código Penal”, diz o
parecer o MPSP.
Consultor Jurídico