“O
painel é a forma mais democrática da pintura. O governo, se quisesse,
poderia mandar pintar painéis em logradouros públicos, como estações,
campos de esporte, etc. É uma forma de levar a arte ao povo, de
imortalizar momentos históricos, de maneira a que todos tenham
possibilidades de vê-los. A tela pertence a uma minoria. O painel a
todos quantos queiram vê-lo.” Depoimento de Clóvis Graciano para o jornal Folha de São Paulo em 15/01/1969.
A
avenida Rubem Berta faz parte da vida de diversos paulistanos. Quando
pensamos nesta via, logo vem em mente de forma exclusiva o trânsito, as
buzinas, o estresse e o cansaço de um dia inteiro de trabalho. Enfim,
ela nos remete ao caos em que apenas uma metrópole como São Paulo pode
nos proporcionar.
Mas
no meio desta avenida tumultuosa, existe uma preciosidade do muralismo
brasileiro em que a correria do dia a dia não nos deixa apreciar com a
devida calma que uma obra de arte necessita.
Em
25 de janeiro de 1969, a cidade de São Paulo estava comemorando seu
aniversário de 415 anos. O prefeito da época era João Vicente de Faria
Lima e várias inaugurações neste dia celebrativo estavam por vir. Dentre
elas a inauguração do Hospital Tatuapé e a finalização da avenida Rubem
Berta, ligando o centro da cidade até ao Aeroporto de Congonhas.
Para
brindar o término desta grande empreitada que se iniciou com o seu
antecessor Francisco Prestes Maia, a gestão do Prefeito Faria Lima
encomendou para o artista Clóvis Graciano um conjunto de 4 murais. O
local foi escolhido foi próximo ao Viaduto República Árabe Síria.
Clóvis
Graciano era multicultural. Foi pintor, caricaturista e muralista.
Também trabalhou como cenógrafo e figurinista em diversas peças de
teatro espalhadas em São Paulo nas décadas de 50, 60 e 70. Em sua
trajetória também foi sócio fundador do MAM (Museu de Arte Moderna de São Paulo), e presidente da Comissão Estadual de Artes Plásticas e do Conselho Estadual de Cultura.
A
elaboração dos murais levou em torno de 6 meses e foi necessário o apoio
de 4 arquitetos e mais 6 pintores ajudantes. Clóvis Graciano nomeou os 4
murais com os seguintes nomes: Subida da Serra, Os Bandeirantes,
Epopeia do Café e A Cidade Hoje. Cada painel mede 10 x 3.5 m².
Na
inauguração estavam presentes alguns familiares do homenageado, Rubem
Berta, e que foi o primeiro presidente da Varig, além de funcionários da
própria empresa e populares. Foi uma cerimônia rápida, pois chovia na
cidade.
Passado 45 anos, o painel que serviu como “porta de entrada para a cidade de São Paulo”, palavras
do então Prefeito Faria Lima, hoje é a porta do descaso perante o
patrimônio histórico que São Paulo vem sofrendo há muito tempo.
Uma
boa parte da argamassa que segura o mural está ficando porosa fazendo
com que alguns azulejos se soltem. São mais de 30 azulejos que não
compõem mais o mural.
Esses azulejos não correm o risco de cair em cima de ninguém, pois a população não tem acesso direto ao mural. A sorte (ou azar) é que quando uma das peças se desgruda, cai no gramado do antigo acesso para a avenida Moreira Guimarães.
A
pergunta que não quer calar. Onde estariam os azulejos que caíram?
Teriam sido recolhidos pela subprefeitura local ou pelo Departamento de
Patrimônio Histórico (DPH) ? Ou se perderam para sempre ?
O conjunto
assinado por Clóvis Graciano mostra a trajetória do desenvolvimento de
São Paulo. Não podemos aceitar que este descaso continue ou, em breve,
não teremos mais ali os azulejos que narram a trajetória da nossa
cidade.
Quem foi Clóvis Graciano ?
Nascido
na cidade Paulista de Araras em 1907, Graciano foi pintor, desenhista,
cenógrafo, figurinista, gravador , ilustrador e muralista. Aos 20 anos
de idade foi trabalhar na Estrada de Ferro Sorocabana, no município
de Conchas onde pintava postes, tabuletas, letreiros e avisos para as
estações ferroviárias.
Em
1934 mudou-se para São Paulo, onde em 1937 iria para o extinto Palacete
Santa Helena, na Praça da Sé, onde juntamente com artistas
como Francisco Rebolo, Mario Zanini, Aldo Bonadei, Fulvio Pennacchi
e outros, além do próprio Volpi constituiriam o famoso Grupo Santa
Helena.
Durante
sua ilustre carreira produziu trabalhos de grande valor para a cultura
brasileira, como o mural Armistício de Iperoig (1962), o retratado aqui
na avenida Rubem Berta (1969), além de outros murais como na avenida
Paulista. Posteriormente, em 1971, foi presidente da Pinacoteca do
Estado.
Graciano faleceu em 29 de junho de 1988, deixando grande legado cultural.
Veja abaixo mais imagens dos murais instalados na avenida Rubem Berta:
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