Topete esculpido com Gumex, bigode delgado, sobrancelhas arqueadas, olhar de conquistador e roupas extravagantes, ele mal mal entra em cena e já arranca gargalhadas da plateia do estúdio da extinta TV Rio, em 1960. Era a estreia de O Bárbaro, vivido pelo ator e humorista Jorge Loredo no programa “Noites cariocas”, que serviria de matriz para o personagem Zé Bonitinho, o galenteator barato e exagerado que marcaria a carreira do artista carioca e a TV brasileira.
O Bárbaro foi rebatizado em homenagem a um cozinheiro que Loredo conheceu em um restaurante de beira de estrada que, por ser muito feio, era chamado de Zé Bonitinho. Os trejeitos do personagem foram inspirados em outra figura real, o Jarbas, um dos companheiros do jovem Jorge Loredo nas maratonas pelos bares da Praça Saens Peña, na Tijuca, onde nasceu.
— Ele tirava um pentezinho do bolso e ficava ajeitando as sobrancelhas e o bigodinho toda hora. Se passava uma moça, cantarolava um tango, um bolero... Fui captando esses trejeitos e criei o personagem — contou.
Autor de bordões inesquecíveis — “Garotas do meu Brasil
varonil: vou dar a vocês um tostão da minha voz...!”; “Mulheres, atentem
para o tilintar das minhas sobrancelhas”; “O chato não é ser bonito, o
chato é ser gostoso”, entre outras —, Zé Bonitinho foi praticamente uma
espécie alter ego de Loredo:
— Eu sofri com uma osteomielite (inflamação nos ossos)
dos 12 aos 46 anos, por isso fui muito mimado. Isso me fez querer ser
mimado pelas minhas mulheres. Era quase um Zé Bonitinho — contou certa
vez Loredo que, ainda na juventude, chegou a ser internado em um
sanatório por causa de uma turberculose.
Os palhaços estão na origem da vocação de Loredo. Para
completar a renda do marido, dona Luiza, mãe do artista, costurava os
figurinos das trupes circenses que chegavam a Campo Grande, onde a
família morava. O ator acreditava que as fantasias da mãe impregnaram
sua retina: já jovem, viu o anúncio dos testes para a escola de Paschoal
Carlos Magno, onde passou depois de ser ensaiado por Oscarito e Mafra.
Estreou interpretando Mercúcio em “Romeu e Julieta” e nunca mais parou.
Na TV, o ator começou dividindo o banco do programa “Praça
da Alegria”, nos anos 1970, com Chico Anysio, Moacyr Franco e Ronald
Golias. Diferentemente de Anysio e e Franco, que tiveram programa
próprio, e de Golias, que era astro absoluto da “Família Trapo” , Loredo
sobreviveu como coadjuvante. O ator chegou a criar outros tipos
famosos, como o mendigo soberbo My Lord e o costureiro François Paetê,
mas Zé Bonitinho sempre foi a sua grande marca, que só desapareceu da TV
quando o programa “A praça é nossa”, do SBT, saiu do ar, no início dos
anos 2000.
Longe da televisão, Loredo chegou a participar de filmes
dirigidos por ícones do cinema nacional, como Rogério Sganzerla (“Sem
essa aranha”, de 1970, e “O abismo”, de 1977) e Arnaldo Jabor (“Tudo
bem”, de 1978). Seu último trabalho em um longa-metragem foi em “Chega
de saudade” (2008), de Lais Bodansky. Em quase todos esses filmes, mesmo
que não estivesse interpretando seu personagem mais famoso, alguns
elementos dele, como o vestuário e acessórios vistosos, de alguma forma
estavam sempre presentes nas composições Loredo.
O artista foi recentemente redescoberto pela geração mais
jovem de cineastas brasileiros. Em 2005, a diretora Susanna Lira lançou o
documentário “Câmera, close!”, uma biografia do ator, exibido no Canal
GNT. No ano seguinte, o ator e diretor Selton Mello, fã do artista, o
dirigiu no curta-metragem “Quando o tempo cair”, para o qual criou um
personagem especialmente apra ele. Em 2003, atuou na peça infantil “Eu e
meu guarda-chuva”, a convite da atriz Andrea Beltrão