19 julho, 2013

Aquarela do Brasil 2.0 - Lobão

Exilado, voava do futuro assobiando um réquiem.
Planava pelos desertos do esquecimento
sentindo uma saudade intensa,
que, de tão grande, curvava o espaço e o tempo.
Uma saudade não sei de quê, não sei de quem.
Deve ser efeito do exílio prolongado.

E na jornada de retorno,
deparo a Aniquilação,
como a encarnação da sedução,
esbanjando simpatia, docilidade e alegria,
pronta para sentenciar o fim dos loucos,
da vertigem, do voo e da ousadia.
A celebrar em êxtase a vitória dos simplórios,
a vitória da classe média endividada,
perambulando feito zumbi no shopping center, noite e dia.
Perseguindo, no vazio da virgindade existencial,
uma diversão que jamais sacia.

Acolhendo, em Seu seio,
playboys agrobregas a desfilar pelos rodeios,
arraiais e micaretas, caçando a língua das periguetes de abadá,
que coisa louca!
Transformando um contato exclusivo numa olimpíada de beijos,
colecionando triunfantes, bactérias, herpes e desejos,
como troféus de céu da boca.

A abençoar intelectuais, empanturrados de propinas
com suas ideologias fossilizadas, um monte de vaselina…
impondo goela abaixo um nacionalismo barato para universitários otários
regurgitarem pastiches viciados, repletos de vaidade imerecida,
ao som das mais horrorosas canções que ouvi na vida,
ao balanço dos mais grotescos rebolados.

Com a santa ignorância dos que defendem, cegos, suas teses
Acobertando num silêncio um tanto cínico, aloprados e bandidos
de um governo cheio de reveses,
catequizando suas verdades imutáveis e eternas,
a patrulhar, ameaçar, comprar, reprimir (quando não, simonalizar)
todos aqueles que não se alinharam
nessa patuscada triste que eles mesmos inventaram:
A Inveja da Pobreza. A cartilha do bom brasileiro.
A terraplanagem é por baixo e a laje é o limite, companheiro!

Para o inferno, vocês, proprietários dessas verdades de merda.
Fascismo não é monopólio da direita nem da esquerda.
Fascismo é imposição inflexível e truculenta de verdades sacralizadas,
geralmente por bem-intencionados perpetradas.
Estou farto de bem-intencionados. Além de nocivos, são cafonas.

E o Sol exibia uma crista vermelha de fogo,
como se tivesse extraído todo o sangue dos penhascos do mundo,
me levando no seu calor a rasgar o ar fazendo o vento soprar
meus farrapos alados, para além de qualquer segurança,
e, das alturas, mergulhar no abismo da garganta mais profunda
à procura da face perdida da esperança.

Você é dependente de ideias pré-fabricadas,
patrocinadas por um bando de salafrários autoindulgentes.
Você é um faminto de misérias embelezadas
que se alimenta de migalhas, a você atiradas
como um animal domesticado,
abanando o rabo, agradecido e contente.

Você faz parte de um rebanho de presas fáceis
repletas de sonhos fenecidos.
E eu? Eu sou o lobo do homem, uivando pra Lua,
sozinho, vencido.
Vencido, como se soubesse a verdade, mas livre,
Assustadoramente livre.

Você acredita em tudo que te mandam,
mas se ofende com tudo o que eu te digo.
Você esquece que a ofensa que vigora
é pura reação, castigo pelo castigo,
sempre em guarda cultivando essa paixão:
o ódio sem razão. Que perigo!
…engendrando o prejulgamento,
a ignorância, a irresponsável precipitação.
A ofensa é o expediente do imbecil.
Sangue e armadilha nos esconderijos do coração!

Não basta apenas esperar por leite e mel,
às vezes, pra ser bom, é preciso ser cruel.
O brasileiro é sempre um bonzinho.
Somos o povo mais sorridente do planeta,
esse eterno país da micareta,
apesar dos 50 mil assassinatos produzidos todo ano,
sem precisar de guerra civil nem de terrorista muçulmano.

Pelas estatísticas mundiais, para haver guerra civil,
é necessário matar, pelo menos, uns 10 mil.
Uma pechincha comparada ao montante macabro
do nosso número imbatível: 50 mil, 50 mil, 50 mil!
E terrorista? Quem, por aqui, precisa de terrorista?
Terrorista é coisa pra amador.
O Brasil é só para profissionais. O Brasil é o Terror!
O Brasil é o Terror!

O Brasil dos estupros consentidos na surdina,
dos superfaturamentos encarados como rotina,
dos desabamentos e enchentes de hora marcada,
dos hospitais públicos em abandono genocida,
dos subsídios da Cultura a artistas consagrados,
dos aeroportos em frangalhos, usuários indigentes,
dos políticos grosseiros, como sempre, subornados,
de cabelo acaju e seus salários indecentes,
da educação sucateada pelo Estado
em sua paralisia ideológica, omissa e incompetente.

Do racismo galopante, na internet,
nas universidades e nas ruas,
com as suas manifestações hostis.
Da queima de índios e mendigos,
por meninos bem-nascidos.
Do apedrejamento, vilipêndio e morte
de mulheres, prostitutas e travestis.

E lá vamos nós, descendo a ladeira!
Rebolativos, minhóquicos, supersticiosos,
crédulos, inabaláveis, venais…
amantes de uma boa trapaça…
com nossa displicência carnavalesca espetacular
e os repetecos anuais dos feriados enforcados de destruição em massa.

E não me venha com essa lenga-lenga do tipo
“não gostou, se manda! vai pr’outro lugar”,
porque eu estou aqui para exterminar:
vossa hiponga modorra, vossa preguiça macunaímica,
vosso caráter vacante, vossa antropofagia cínica,
pois esse lugar também me pertence,
e ninguém vai me calar. Ninguém vai me calar.

E nas almas de artistas natimortos
em berço chapa branca e exangue,
ecoam as vozes dos cadáveres insepultos de sempre,
impondo língua morta a se eternizar
numa geração de frouxos engrossando sua gangue.

Frouxos, acometidos por
síndrome de dignidade intelectual.
Espalhando o evangelho da Mediocridade
para milhões de populares e estudantes semianalfabetos
com o beneplácito da imprensa oficial.

E no cagaço metafísico
das multidões de contritos telerredimidos
brota o pavor da morte, da vida, do sexo,
da doença, da pobreza e do castigo.
Fazendo bispos milionários,
gângsteres do paraíso,
lotearem pedacinhos do firmamento
para histéricos apocalípticos aguardarem
o fim do mundo fora de perigo…

Às vezes é mais exato ser impreciso, contradito.
Ser o Terror da próxima edição, a Corrosão, o Maldito
dos jornais que me inventam em manchetes
tentando me silenciar em vão.
Uma pena que nunca me enxergaram,
nem nunca me enxergarão…
É subestimando o inimigo que se perdem as guerras
e, por isso mesmo, agradeço a desatenção.

Pois agora é tarde e a Eternidade é Agora.
O brasileiro, com sua autoestima permanentemente precária,
vive adernando entre Ali e Outrora
num orgulho às avessas, que destrói
qualquer possibilidade de enxergarmos
o que verdadeiramente somos,
e isso dói.

Uma nação que se recusa terminantemente a crescer,
paralisada por um embevecimento geonarcisista, indolente e servil.
Bem-vindos à Terra do Nunca!
Bem-vindos a essa pocilga chamada Brasil!

E eu? Eu sou o Nada,
o Fim da vossa picada,
o Oblívio dos desatentos,
a Ira da reação,
o Exterminador de todos vocês,
bunda-moles de plantão.

Muito prazer! É chegada a vossa hora!
Comecem a rebolar como é do vosso feitio,
pois eu voltei para decretar o fim
dessa festa pobre que vocês armaram.
Dessa lambança de favorecimentos e apadrinhamentos
de causar náuseas, vômitos & arrepios,
desse imenso arraial brega, tosco e vazio,
um fim por mim ansiado, premeditado,
e já há muito tempo datado, tardio.

Agora, mãos à obra.
Estou na área e vamos começar.
Agora é necessário andar entre os pedestres,
viver as suas banalidades
e convocá-los, enfim, para o desafio
que é o delírio de viver e de voar.