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Jonathan Anderson. Foto: Getty Images
Olá, e bem-vindos ao RE-SEE, a nova newsletter semanal da ELLE Brasil.
Na semana passada, os principais grupos e marcas de luxo começaram a divulgar seus resultados financeiros do primeiro trimestre de 2025. Economês pode ser chato, mas são informações com impacto direto sobre o lado criativo do negócio. A chegada – agora oficial – de Jonathan Anderson na Dior Men, tem a ver com isso. A maneira como o boato foi confirmado também. Nesta segunda edição, falamos ainda sobre o que o aumento de preços da Hermès indica sobre o mercado e a nomeação de Duran Lantink como diretor de criação da Jean Paul Gaultier. |
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Todo mundo sabia, só faltava a confirmação. Ela veio na quinta-feira (17.04), da boca de Bernard Arnault. Em reunião com acionistas, o CEO do grupo LVMH afirmou que a próxima coleção da Dior Men, prevista para ser desfilada no dia 27 de junho, na semana de moda masculina de Paris, será assinada pelo estilista irlandês Jonathan Anderson (ex-Loewe).
A informação pareceu ter saído sem querer. Um investidor perguntou sobre a vaga de diretor criativo, aberta desde 31 de janeiro, quando o britânico Kim Jones deixou o posto, e Arnault respondeu. Horas depois, chegou um e-mail oficializando a conversa e nada mais.
Segundo a boca miúda, Anderson não irá assumir apenas a linha masculina da Dior, mas também a feminina. Acontece que essa última está sob os cuidados de Maria Grazia Chiuri. Ela desfilou uma coleção de pre-fall em Quioto há uma semana e apresentará outra de cruise em Roma no dia 27 de maio. Se é a sua última, ninguém sabe. Parece que existem questões contratuais e trabalhistas na história. Anúncio oficial, só com todos os pingos nos is, assinaturas e um pix.
Desde meados do ano passado, especula-se mudanças nos comandos da Dior. A casa não estava na pior, mas resultados e crescimentos menos expressivos acenderam um alerta. Um relatório de janeiro do banco HSBC apontou sinais de estagnação na grife, com coleções e lançamentos repetitivos.
Situação similar aconteceu com a Gucci de Alessandro Michele, dadas as devidas proporções e contextos. Apesar das pressões e avisos, a italiana demorou para agir. Deu no que deu. As vendas despencaram e a recuperação anda sofrida.
A reunião dos acionistas da LVMH foi realizada uma semana após o grupo anunciar uma retração acima do esperado nas receitas (5% na divisão de moda e acessórios). Com um mercado bem desafiador pela frente, alguns investidores estavam ansiosos por ações efetivas na segunda maior marca da holding. O anúncio de Bernard Arnault talvez não tenha sido tão inocente assim.
Nos seus quase 12 anos na Loewe, Jonathan Anderson multiplicou as vendas em cerca de sete vezes, para quase dois bilhões de euros. Seus desfiles recentes se destacaram pela criatividade, técnica e imagem, sem deixar de dar atenção às demandas comerciais e atender diferentes segmentos do negócio (acessórios principalmente). Ele ainda estreitou relacionamentos com celebridades e estabeleceu laços importantes com outras áreas de produção e expressão cultural, em especial o cinema e as artes plásticas. Feitos que podem beneficiar bastante a Dior.
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Outro boato que virou fato
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Duran Lantink. Foto: Getty Images |
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Outro boato que virou fato foi a nomeação do estilista holandês Duran Lantink como diretor criativo da Jean Paul Gaultier. A casa estava sem um profissional fixo no cargo desde a aposentadoria de seu fundador, em 2020. O foco principal era a linha de alta-costura. A cada estação, um designer era convidado para interpretar a identidade e história da marca.
É um formato interessante, embora com resultados variados. Entre as parcerias mais bem-sucedidas estão a com Haider Ackermann (Tom Ford), Glenn Martens (Diesel e Maison Margiela), Nicolas Di Felice (Courrèges) e Simone Rocha. Agora, surge a possibilidade de estabelecer uma linguagem visual mais consistente. Tanto na couture quanto no prêt-à-porter, que retorna ao calendário de desfiles da semana de moda de Paris em setembro deste ano.
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Duran Lantink, inverno 2025. Foto: Getty Images |
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Duran Lantink, inverno 2025. Foto: Getty Images
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Duran Lantink vem ganhando notoriedade há algum tempo. No ano passado, ele levou o prêmio Karl Lagerfeld do LVMH Prize. Talvez você reconheça seu último desfile (inverno 2025) pelas próteses de um torso masculino (colocado em uma modelo mulher) e de seios femininos (vestido em um homem). É um tipo de comentário semelhante às provocações de Gaultier. O que também é bem adequado ao legado da maison do Enfant Terrible é a qualidade de corte e a construção da alfaiataria. Seus ternos e sua visão sobre a tendência corporativa da temporada são dos mais interessantes.
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O que o aumento de preço da Hermès indica
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Boa parte das tarifas de importação anunciadas por Donald Trump no dia 02 de abril está suspensa até 08 de julho. Por enquanto, valem apenas as taxas de 10% sobre todos os produtos importados para os Estados Unidos (exceto os da China, sujeitos a cobranças mais elevadas). Pode continuar assim por mais ou menos tempo. Não dá para saber. E a Hermès é que não vai esperar para ver. A partir de 01 de maio, os produtos da marca francesa vendidos em território estadunidense vão ficar mais caros.
Quem gasta a partir de 10 mil dólares em uma bolsa Birkin ou em uma Kelly não vai se importar em pagar um pouco a mais no mesmo produto. É um dado histórico que os high-net-worth individuals (os super-ricos) desfrutam de certa imunidade às flutuações da economia. Não por acaso, quando o frenesi e as poupanças pós-pandemia minguaram com inflação e aumento no custo de vida, foi para eles que todo mercado de luxo olhou em busca de salvação.
Com a onda de desaceleração no consumo nos últimos três ou quatro anos, só não levou a pior quem investiu em uma imagem ou produto muito específico (Prada e Moncler, por exemplo) e quem deu preferência a clientes de altíssima renda (Hermès, Brunello Cucinelli e algumas joalherias). O que já era exclusivo está ficando ainda mais.
No primeiro trimestre de 2025, a receita da Hermès cresceu abaixo do esperado, 7% em vez de 8,8%. A redução tem mais a ver com a queda da demanda na China do que com as novas regras alfandegárias nos EUA. Quando e se as tarifas passarem a valer nos termos anunciados, o problema para as grandes marcas de luxo não será exatamente os custos. É o baque na confiança do consumidor. Dos mais ricos inclusive. Em entrevista ao Financial Times, Bruno Pavlovsky, presidente de moda da Chanel, disse que é possível prever o nível de negócios de suas lojas ao analisar o mercado de ações.
No final do ano passado, por exemplo, a vitória de Donald Trump nas eleições gerou um boom na bolsa de valores local. Como consequência, o consumo de luxo na região cresceu expressivamente. Agora, a situação é inversa. Com fuga de investimentos e derretimento das ações, o fluxo de clientes nas lojas diminui. Quem vai querer gastar com seus investimentos em risco?
O caos instaurado por Trump nos mercados financeiros, pelas ameaças de guerra fiscal e de intervenções no Federal Reserve, abala as estruturas de gente que raramente sente tremores quando alguma coisa balança na economia. Bancos e outras instituições financeiras já preveem que, em vez de crescer 5% neste ano, o setor de luxo deve encolher algo em torno de 2%. Entre as principais ameaças, além das disrupções na cadeia produtiva, estão a liquidação de riquezas, a limitação do poder de compra nos EUA e uma deterioração generalizada da confiança do consumidor.
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@luigitorre é diretor de reportagem de moda da ELLE Brasil. A newsletter RE-SEE chega toda terça-feira. |
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