De que adianta nos dar bombom e rosas no 8 de março se, no cotidiano, a rotina é a violência? De que adianta exaltar nossa força, nossa resiliência, nossa história, se podemos ser mortas apenas pelo que somos? Quando dizemos que o 8 de março não é dia de flor, mas de luta é porque ainda é preciso dedicar uma data no calendário para expor a violência e opressão sofridas cotidianamente pelas 4 bilhões de mulheres que existem no planeta.
Ainda é preciso esse dia para lembrarmos dos corpos tombados apenas por serem corpo-mulher. Para demonstrar que somos uma onda, um oceano vasto e pulsante que, apesar de avanços conservadores e da extrema-direita, não dará um passo atrás.
Como publicamos essa semana, o aumento de 23% na violência armada contra mulheres de 2023 para 2024 é um dos motivos pelos quais lutamos em meio a uma lógica fascista de quanto mais arma melhor, quanto mais repressão melhor.
Lutamos pela vida. Lutamos por coisas simples como andar na rua sem ser alvo – seja de importunação ou de violência. Lutamos para não ouvir um presidente ou qualquer outro líder afirmar que convidou uma mulher ao cargo porque ela “é bonita”. Lutamos para que meninas estejam seguras em suas casas, que são onde crianças e adolescentes mais sofrem com violência sexual. Lutamos para que não soframos violência obstétrica – como aconteceu com uma amiga querida ao dar a luz à pequena Filipa essa semana.
Lutamos para que as mulheres negras tenham oportunidades, para que meninas pretas como minha sobrinha possam sonhar em ser o que quiserem – de dona de casa a imperadora do Universo. Para que mulheres negras periféricas, quilombolas, indígenas, trans, travestis, mulheres com deficiência, mulheres de origem asiática e tantas outras tenham sonhos, respeito, dignidade e acesso a direitos, incluindo o mais importante deles: o direito à vida.
Luto para criar um mundo que minha avó, dona Jandira, mulher negra, doméstica e analfabeta, nunca sonhou em ver e nem verá, mas que a bisneta dela possa viver.
Lutamos para que nossos corpos sejam respeitados independentemente de sua identidade de gênero, opção sexual, formato físico e vestimenta. Lutamos por um mundo onde não tenhamos medo de estar em relações afetivas com quem quer que seja. Essa semana, publicamos um estudo que revelou os casos de mulheres que sofreram violência de parceiros que pertencem às forças de segurança.
O artigo da ativista Sofia Rivera, também publicado pela Ponte essa semana, lembra a luta das profissionais do sexo, sempre relegadas a um submundo de violência e precarização, e agora mais uma vez ameaçadas por uma classe conservadora detentora da moral. A mesma que tem tentado negar cortes de impostos para os alimentos da cesta básica no Congresso Nacional.
Relembramos a luta de Marielle Franco, cuja assassinato completou 7 anos ontem (14/3). Seu corpo físico e político foi alvo da mais extrema das violências, mas seu legado se tornou um campo largo e indelével de sementes na política brasileira.