24 agosto, 2014

As vezes, a batina cheira a gasolina, diz padre fundador de motoclube

Edson Roberto Codato tem 51 anos e construiu um triciclo e uma moto.

Ele também disse que já sofreu preconceito por causa da aparência.

Alan Schneider Do G1 Bauru e Marília
Padre Edson estacinou o triciclo na garagem da igreja da Paróquia São Bras (Foto: Alan Schneider/G1)Padre Edson estacionou o triciclo na garagem da igreja da Paróquia São Bras (Foto: Alan Schneider/G1)
O padre Edson Roberto Codato, de 51 anos, é muito conhecido em Bauru (SP) não só pelos fiéis da paróquia São Bras, no Núcleo Gasparini, mas também pelos apaixonados por motos e triciclos. Integrante fundador do motoclube ‘ByCoda’s do Asfalto’ e com uma irreverência de dar inveja, padre Edson afirma que para aliar as funções dentro da igreja e em cima do veículo, a batina, às vezes, cheira gasolina.
Ele construiu o triciclo sozinho (Foto: Alan Schneider/G1)Ele construiu o triciclo em um ano e dois meses
(Foto: Alan Schneider/G1)
“Tem dia que chego para celebrar a missa com a batina cheirando gasolina. Isso acontece. Faz parte porque às vezes, no atropelo, que a gente acaba tendo que se desdobrar e, realmente, o cheiro da gasolina acaba se tornando um pouco o cheiro da gente. Mas, é um cheiro do bem e não da maldade”, disse o pároco, que usa um capacete com a mesma cor da batina.
A moto começou a fazer parte da vida de Edson há 20 anos, quando saiu de Bauru como padre para ensinar a palavra de Deus no sertão da Bahia. “Depois que ordenei por seis anos em Bauru, fui para a Bahia. A paixão com a moto surgiu mais da necessidade. Gostava de moto só que não tinha. Fui para a Bahia, consegui uma moto doada. Era o único padre que gostava de moto. Com as estradas ruins, a necessidade era maior de usar a moto e comecei a pegar mais amor pela coisa”, lembrou.
Alguns anos mais tarde, padre Edson foi transferido para Passos, em Minas Gerais. E foi lá que a moto entrou de vez em sua rotina. “Comecei a fazer parte e ajudei a fundar o motoclube ‘ByCoda’s do Asfalto’. Ai veio aquele negócio: eu preciso ter uma moto também”, enfatizou.
Sem dinheiro, ele usou as técnicas que apreendeu aos 16 anos em um curso de mecânica do Senai para construir a própria moto, ou melhor, um triciclo. “Não queria ter uma motinha, queria uma moto grande. Quer saber de uma coisa? Dinheiro pra comprar uma moto eu não tenho. Então, vou ter que fazer a minha. E fiz o meu triciclo há 10 anos. Já andei 50 mil km com ele”, explicou.
O triciclo levou um ano e dois meses para ficar pronto e, até hoje, recebe vários acessórios. Além do triciclo, padre Edson também já montou uma Styllus Chopper 450. Convidado nos anos 2000 para retornar a Bauru, ele disse que engatou a moto atrás do triciclo e pegou a estrada rumo ao Centro-Oeste Paulista. “Construí os dois veículos usando pedaços de outros. Peça por peça. Deixei a oficina em Passos, mas voltei a Bauru dirigindo o triciclo com a moto no engate.”
Na igreja ele é conhecido pelo padre motociclista (Foto: Alan Schneider/G1)Com traje de motociclista, padre Edson em momento de reflexão no altar da igreja Foto: Alan Schneider/G1)
Peregrinação na estrada
Além de participar de vários eventos de motoclubes pelo país e de celebrar missas aos fiéis do Núcleo Gasparini e do distrito de Tibiriça, padre Edson sempre relacionou a vontade de andar de moto com a religião. Tanto é que ele integra a “Pastoral da Estrada” com a finalidade de evangelizar as pessoas que vivem nas rodovias. “Buscamos evangelizar as pessoas que estão afastadas de Deus, da Igreja. E na estrada encontramos muitas. É uma grande satisfação ter essa missão cumprida. Você saber que está na estrada para evangelizar. E quando você celebra uma missa diferenciada, especiais, com liturgia diferenciada, as pessoas veem até você, debruçam, choram no seu ombro. É recompensador”, contou.
Com o estilo motociclista no “sangue”, o pároco precisou atender ao celular durante a entrevista aoG1. Detalhe: uma das músicas ícones do rock’n'roll, Born to be wild, é o toque principal do aparelho.
Preconceito
Padre Edson afirmou também que já sofreu preconceito por causa de sua aparência. Ele, inclusive, lembrou uma situação. “Sofri preconceito quando morava na Bahia pelo fato de ter esse estereótipo mais despachado. Quando viajava da Bahia para São Paulo ou para Bauru, no começo me achava um cara de muita sorte porque sempre viajava sozinho no ônibus. Depois comecei a perceber que não era sorte. Era preconceito. E durante as viagens comecei a conversar com as pessoas, que quando sabiam que era padre. Poxa, era um marginal e, de repente, parecia Jesus. Foi um pulinho. Lá eu sofri.”
Padre já andou cerca de 50 mil km com o triciclo (Foto: Alan Schneider/G1)Padre já andou cerca de 50 mil km com o triciclo
(Foto: Alan Schneider/G1)
Para o “padre motociclista”, a religião tem várias maneiras de evangelizar, independentemente da cara e do corte de cabelo. “Sou padre. Celebro como qualquer outro padre da igreja Católica Apostólica Romana. Só que eu gosto de moto. E uso a moto como uma ferramenta para evangelizar as pessoas que muitas vezes estão afastadas da igreja por algum motivo. E eu consigo aproximar essas pessoas exatamente pelo jeito de evangelizar”, disse.
Dentro da igreja e nos eventos de motoclubes, ele informou que jamais sofreu discriminação. “Meus fiéis me aceitam do jeito que sou carinhosamente e vários começaram a gostar de moto por causa de mim. Alguns fieis vão aos encontros de moto e tocam nas missas. Já no motoclube sempre se espanta um pouquinho, porque eles concebem a ideia de um padre, com jeito de padre, cara de padre, roupa de padre. A princípio o pessoal assusta, mas depois quando você começa a conversar um pouquinho, já se derrete, vira amigo de infância e quer tirar uma foto pra mandar para a mãe.”
O padre avisou que suas missas são diferenciadas. E citou uma comparação. “Existe o médico. Só que cada médico tem uma especialidade. Um cuida do joelho, outro do coração, do pé. É importante a gente perceber que dentro da igreja também tem suas diversidades. Todos são padres, mas cada um tem uma vocação específica. Tem padre que cuida da saúde, dos camilianos, e eu, sou um padre que escolhi evangelizar a estrada, os motociclistas. Não sou uma andorinha sozinha, existem outros com a mesma vocação. É onde me encontrei, me sinto bem e consigo me realizar”.
  • Como todo motociclista, ele também aprecia um churrasco e uma cerveja (Foto: Arquivo pessoal/Padre Edson)
Como todo motociclista, ele também aprecia uma
cerveja gelada (Foto: Arquivo pessoal/Padre Edson)
Despesas
Uma vez por semana, os motociclistas da turma do padre Edson fazem um churrasco beneficente para ajudar nas despesas da “Pastoral da Estrada” e da Paróquia São Bras.
“Toda quinta-feira a gente se reúne em uma concessionária de Bauru. O pessoal leva carne para assar e a paróquia entra com o bar, com cerveja, refrigerante e água. A renda é revertida para a paróquia. A minha paróquia é de periferia, pobre. A gente acaba complementando o que falta para construir algumas coisas dentro da igreja”, informou.
São pessoas que sabem da causa. O encontro é beneficente para ajudar a ‘Pastoral da Estrada’. Todos estão convidados. Várias bandas participam no local, que também tem segurança e praça de alimentação completa, DJ e globo da morte. A entrada custa R$ 10”, completou.
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Pároco realiza evento com cerca de três mil motociclistas neste fim de semana (Foto: Alan Schneider/G1)Pároco realiza evento com cerca de três mil motociclistas neste fim de semana (Foto: Alan Schneider/G1)
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