03 outubro, 2013

Entrevista com Lúcio Big, da Operação Pega Safado


Imagem: Reprodução
Criador da OPS, “Operação Pega Safado”, com apenas uma câmera de filmar, inteligência e criatividade este comerciante e ativista da cidadania reuniu grande material investigativo. Coisa que nem a polícia nem o Ministério Público conseguiram. Protocolou no Tribunal de Contas da União um pedido de providências contra vinte parlamentares federais por desvio de verbas públicas. 
Seria o caso de se perguntar: por que um número tão insignificante, vinte, perante a realidade brasileira? Lúcio poderia responder que atua sozinho. Mas não é o caso. Big criou uma rede de fiscais que o ajudam a coletar dados. A esperança então é o número de vinte ser multiplicado por dezenas. 
 
No caso da denúncia no TCU, o ministro relator Walton Alencar Rodrigues já determinou diligências para apuração dos fatos e deve imaginar que com Big não pode brincar. A OPS vem dando certo e produzindo filhotes e adeptos pelo país. O site Observatório Geral fez uma entrevista com Lúcio Big, em que sua visão de mundo é contada para os admiradores e público em geral. 

Você teve ótima repercussão na mídia pelo seu projeto um tanto quanto autoral e visceral, algo como “pegar safado”, o que o transformou, em certa medida, numa espécie de queridinho dos movimentos e mesmo da imprensa. Como observador atento, qual é a sua visão da corrupção no poder público brasileiro? 

O poder público brasileiro é corrupto em todas as suas esferas. Não há qualquer órgão imune a este mal. Mas o que ocorre no poder público nada mais é do que o reflexo da cultura do povo brasileiro. Nós somos levados a corromper e a sermos corrompidos desde pequenos, desde “colar” na prova, por exemplo. Nós jamais estaremos livres da corrupção, mas podemos minimizar o seu raio de ação e a sua freqüência. Para isso é necessário criar a cultura de fiscalizar o poder público e externar tudo aquilo que for encontrado de errado, como fiz na OPS – Operação Pega Safado. Deixe um celular no banco da praça. Em segundos ele será levado. Mas experimente deixar o mesmo celular no mesmo banco da praça, mas com pessoas o vigiando. Ele não será roubado tão facilmente. Esta é a função do “eu, fiscal”. 

Você que é engajado em movimentos populares de combate à corrupção, como viu o Junho 2013? Foi um porre de cidadania ou as manifestações estão latentes e serão retomadas a qualquer momento? 

Eu me surpreendi com a dimensão que os protestos tomaram naquele mês. É certo que houve um porre de cidadania e que as coisas agora se aquietaram novamente. Mas os corruptos de plantão não devem se tranquilizar. O povo é como a brasa escondida naquela fogueira de ontem. Basta um gravetinho e um assopro para que a fogueira se acenda novamente. 

A sua autodenominada “iconoclastia incendiária” passa por uma pauta anárquica, terrorista ou meramente transgressiva em que a palavra incendiária represente um certo radicalismo? Você acredita que contra certas estruturas sabidamente podres há que se ser incendiário ou no mínimo radical? 
 
Eu não me vejo anárquico ou terrorista, mas transgressor às leis obscuras daqueles que insistem em fazer do que é público, um bem privado. Há de se radicalizar e até incendiar a estrutura corrupta e corruptiva da máquina estatal. Não deve haver espaço para a libertinagem feita com o dinheiro público. 
 
Como está Brasília? O cinismo triunfou e se estabeleceu como teoria ou cultura, ou ainda há remédio social para a corrupção? Os movimentos e resistências cumprem um protocolo de cidadania ou conseguem efetivamente impactar ou amedrontar os corruptos? 

Brasília descansa em paz até que um novo “junho/2013” apareça, mas eu não vejo que exista um retorno possível para aquilo que se iniciou em 2011 quando as redes sociais permitiram a união de milhares de pessoas pelo país em torno de ações no combate à corrupção. O processo se iniciou e o fim se dará quando toda essa corja que hoje toma conta da política brasileira e todos os demais que só estão esperando uma oportunidade para abocanhar a sua fatia tenham ido desta para uma melhor. Os movimentos sociais estão minando a área de conforto dos corruptos e eles sabem que esta é uma viagem só de ida e que daqui a alguns anos, todos estes escândalos diários que vivenciamos hoje em dia serão nada além do que páginas de um livro de história. Acabar com a corrupção só quando o planeta Terra entrar em extinção, mas minimizar o raio de ação e a frequência, eu não tenho dúvidas de que é possível com os movimentos e com ações de fiscalização como as da O.P.S. 

O seu método de ação que você deu o nome de Operação Pega Safado, OPS, é algo que pode ou deve ser feito por qualquer um? 

A grande sacada da operação é justamente esta. Mostrar aos brasileiros que qualquer um que queira e que tenha acesso à internet pode “e deve” ser um fiscal. As informações estão disponibilizadas aos montes na internet e aquelas que não estão, poderão ser encontradas através de uma simples solicitação ao órgão que as detém. Ser fiscal, cobrar, disseminar informações incongruentes nas redes sociais e ainda, denunciar aos órgãos competentes os indícios de “mau uso do dinheiro público” é um ato de cidadania sem precedentes. 

Na sua avaliação as instâncias oficiais de persecução e descoberta de ilícitos – polícias, Ministério Público, corregedorias, tribunais de contas etc., com a Constituição de 1988 conseguiram reduzir o nível de corrupção ou foram parte integrante do processo cultural de corrupção que assola o serviço público brasileiro?

Até mesmo nestas instâncias há corrupção, mas eu creio que as ações, principalmente da Polícia Federal e do Ministério Público, impuseram certo limite a alguns grupos de corruptos pelo país. É claro que eles não resolvem o problema sozinhos, mas formam um tijolinho a mais na construção de uma nova cultura, a cultura do “meu é meu e o seu é seu”.

Observatório Geral

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