Há um conjunto de fatores que são dados como certos na nossa vida – a morte e os impostos, por exemplo. Mas dá vontade de dizer que a subida de preços da Netflix está também a tornar-se uma constante incontornável. Vamos usar, para efeitos de exemplo, os valores relativos ao mercado norte-americano, aquele no qual a Netflix opera há mais tempo. Quando foi lançado, em 2012, o serviço de streaming disponibilizava apenas um plano, custava 7,99 dólares e permitia a transmissão de conteúdos em HD em dois dispositivos em simultâneo. Esse mesmo serviço custa hoje 17,99 dólares. Isto significa um aumento de 125% (!) em apenas 13 anos, o que dá um aumento médio anual de 9,6% no preço. O plano premium, que disponibiliza conteúdos em Ultra HD e suporta até quatro dispositivos em simultâneo, foi lançado em 2013 (11,99 dólares) e desde então também já subiu mais de 100% no preço, custando agora 24,99 dólares. É justo dizer que, atualmente, a Netflix ainda disponibiliza uma versão ao preço inicial, por 7,99 dólares, mas que é 'pior' do que a versão de 2012 – além da subscrição, o utilizador ainda tem de levar com publicidade e o catálogo de conteúdos disponível é mais curto. Se fizermos uma conversão cambial, percebemos que até temos sorte. Em Portugal, o serviço premium custa atualmente 17,99 euros (uma subida de dois euros face ao preço do ano passado), o que é significativamente abaixo dos 23,8 euros que a mesma subscrição custa atualmente nos EUA. Mas tudo isto dá que pensar. A Netflix argumenta (e bem) que precisa de aumentar os preços para aumentar também a capacidade de investimento na produção de novos conteúdos para a plataforma. É que a Netflix vive dos conteúdos – dos que produz internamente e dos que compra a outros produtores. Portanto, não é de facto barato alimentar uma máquina gigante como é a da Netflix. Mas onde é que isto para? Quantos mais utilizadores a Netflix tem, mais necessidades de conteúdo tem e mais terá de acabar por cobrar. Mas este modelo só é sustentável até um determinado ponto. Imagina-se a pagar, por exemplo, 25 euros por mês só para aceder à Netflix? Eu não. Mas é para aí que caminhamos. Os americanos já lá estão. Haverá quem consuma filmes e séries em número suficiente que justifique tal investimento, mas sinto que o mundo do streaming, no global, está a chegar a um ponto de tensão – se esticar a corda mais um bocadinho, vai rebentar. O que seria uma pena, pois a Netflix e os seus pares têm muito mérito na forma como ajudaram a tirar utilizadores à pirataria, pelo facto de terem bons preços, uma grande experiência de utilizador e muitos conteúdos relevantes. Mas em países como Portugal, onde os utilizadores são muito sensíveis ao valor dos produtos (pelo facto de sermos um país de baixos salários), abusar nesta área pode significar perder irremediavelmente as pessoas para o logro dos conteúdos ilegais. É um equilíbrio difícil de atingir, mas que devia ser ponderado de forma séria. Os números de subscritores mundiais dizem que o plano da Netflix está a funcionar, mas parece-me que a pergunta é legítima: durante quanto tempo mais? Antes da despedida, deixar os parabéns ao Ricardo Parreira, da PHC Software, por ter construído um dos maiores casos de sucesso de uma 'software house' portuguesa e que agora culmina na venda daquela que é uma das mais reconhecidas tecnológicas 'made in' Portugal. Boas leituras! |