10 setembro, 2014

Milton Cunha: Eu, lixo moral


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Eu e meu companheiro aconselhamos sempre a bondade e a grandeza de espírito

Rio – Penosa vida que eu menino tive com meu impossível pai. Às vezes lembro dele com uma ternura enorme, porque sei que ele não conseguia lidar com o que eu era, e acreditem, eu era! O que um jovem senhor sem repertório cultural e, mais que isso, sem repertório emocional, faz com uma criança-filho que foge totalmente aos padrões aceitáveis de uma época, um lugar, uma situação? Pois foram quase duas décadas de embate, prisão, tormentas, e alguma pouca bonança. Ele não me aceitava, e eu fugi enquanto pude, para sobreviver às ameaças de morte, com requintes de crueldade, porque discurso em terceira pessoa: se eu tivesse um filho veado, eu prenderia a cabeça dele contra a parede e com um soco no meio da cara eu estourar-lhe-ia os miolos. Quem? Eu. Ali, a esperar a execução, que, sabia, não viria nunca (só o que importava era o terrorismo psicológico). Já viveram em eterno estado de alerta, quando até o sono precisa ser vigiado para rapidamente sair dele?
Rodo neste redemoinho diante da televisão, agora adulto. Vejo Malafaia bradando pelo lixo moral que sou, porque sou. Onde vamos parar com tantas ameaças, quem eles querem amedrontar, nesta terrível batalha santa sem vencedores, porque é preciso votos, votar, votação. Aterrorizado diante do Pai, sei que ele tem todo o direito de existir, de bradar, de crer. Não pretendo que ele e seus dogmas morram. Para sempre vamos viver no olho do furacão. Eu, você, os que conhecem a imobilidade do pavor. Quando eles podem, eles podem muito, enquanto somos crianças. Depois crescemos e novas crianças terão que enfrentá-los, em busca de aliviante capacidade de raciocínio. Só queria sobreviver, só queria ser eu, sem praticar nenhum mal, jamais o extermínio.
Mas meu amor por meu companheiro, nestes 7 anos em que estou casado, não faz mal a ninguém. Somos respeitadores, generosos, cordatos com os humanos, nossos semelhantes. Quem se aproxima é bem-vindo, não somos criminosos, nem interesseiros, nem sequer queremos mandar na vida alheia, só aconselhamos sempre a bondade e a grandeza de espírito. Não precisamos do dinheiro público, mas cobramos incessantemente o bom uso dele para que os desamparados melhorem de vida. E seguimos em frente, passeando por entre tigres de garras afiadíssimas e Deuses que desejam o nosso aniquilamento. Um Deus equivocado na versão religiosa extremada; porque acreditamos ser Deus uma libertária luz que aplacará todo o sofrimento causado pela agressiva intolerância. A mala faia e a humanidade avança!

Milton Cunha: Eu, lixo moral


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