22 maio, 2013

Meninos, eu vi - Coluna Fernando Peixoto, Colunas, Manchete (sobre eleição Portela)


Meninos, eu vi. A rua que homenageia aquela cantora de voz forte e longas madeixas estava lotada. Uma multidão se aglomerava na porta da quadra, à espera do resultado que o tempo psicológico teimava em fazer demorar ainda mais. De vez em quando alguns fogos pipocavam no céu e as pessoas gritavam e aplaudiam, mas logo depois a apreensão voltava a tomar conta, apesar da confiança que era carregada no peito. E foi aí que o Boca gritou no microfone: “Ganhamos!” Era a apoteose geral.
 
É assim que eu vou contar o que eu testemunhei na noite de ontem, na rua Clara Nunes, quando eu estiver bem velhinho. Vou falar de como me emocionei e chorei junto a tantos outros apaixonados pelo samba, de várias bandeiras e multicores. Vou contar como uma senhorinha que eu nem conhecia me abraçou e me beijou, com um sorriso estampado no rosto, antes de se juntar ao grupo que invadia a quadra para comemorar. Vou dizer dos incontáveis cumprimentos de “parabéns pela nossa vitória” que recebi, mesmo não sendo portelense. Mas isso era o de menos; naquele momento o Portelão era a Capela Ecumênica do Samba.
E vou citar o nome de tantos amigos, valorosos, combativos e acima de tudo verdadeiramente apaixonados pela Águia de Oswaldo Cruz e Madureira. Amigos como o Vanderson, o Almir, o Paulo Renato, o Felipe e o Pavão; amigas como a Simone, a Adriana, a Lúcia Boudrini, a Lúcia Pinto e a Luciana, que desde a primeira hora se alistaram nessa batalha em defesa da honra e glória portelenses, entrincheirados e armados de paixão, caráter e determinação. E quando eu contar esse evento histórico, o que vai ficar mais vivo na minha memória é a imagem do meu irmão Rogério, homem de sangue Azul Portela, mas que naquele momento voltava a ser criança, como se realmente um rio passasse em sua vida e os olhos lhe servissem de cascata. Aquele choro, que molhou a Clara Nunes e depois o Portelão, era a vertente de dias, meses, anos de luta cujo único arcabouço era o desejo de varrer para bem longe as pragas e as ervas daninhas que haviam se alastrado naquele solo sagrado.
Vou falar também da felicidade daquela gente tirando fotos e saudando a massa, estendendo as mãos com os dedos indicador e médio em riste, formando o “V” de “Vitória”.
O “V” de “VERDADE”

Fernando Peixoto é professor de história e integrante da coordenação do Prêmio Samb@-Net.