17 março, 2013

Caetano Veloso escreve sobre a eleição de Marco Feliciano


"Será crível que Marco Feliciano tenha sido escolhido presidente da Comissão de Direitos Humanos e Minorias? Na explicação que ele ofereceu aos fiéis da sua igreja, a África é citada várias vezes como “essse país”, o que mostra ignorância a respeito do assunto que tratou com tanta veemência. Nitidamente ele vê a África como um todo unitário. Bem, a maldição dos que, miticamente, foram popular a África já foi usada antes pelos racistas de vários lugares para justificar a escravidão. Feliciano a usa, sem cuidado, para explicar Idi Amin, a Aids, as faminas etc. Uma autoridade responsável por uma comissão de direitos humanos não pode basear suas falas e atitudes em dogmas religiosos. Menos ainda se ele demonstra simplismo grosseiro na interpretação destes.

"É difícil admitir que presida uma comissão que supostamente protege as minorias um homem que grita, irado, que se os homossexuais querem fazer “suas porcarias”, que as façam escondidos dentro de seus quartos, em suas casas, nunca se beijando em locais onde suas filhas possam ver “dois homens barbados, de pernas raspadas, aos beijos”. O pleito de casamento gay é um pleito de minoria representada que deve ser estudado por comissões parlamentares que tratem do assunto com calma, lucidez e isenção. Você pode seguir uma fé que determina que os atos homoafetivos são pecado (na verdade, são O PECADÃO, como observou alguém que meditou sobre o assunto, já que é um pecado que, dentre todos, costumava despertar a ira até dos incréus, sendo incomparável com o falso testemunho, a gula ou mesmo a atividade sexual livre entre pessoas de sexos opostos), mas essa maldição religiosa lançada sobre um tema não pode entrar aos berros num grêmio de legisladores que deveria acompanhar o movimento da sociedade auscultando suas forças e tendências. Há religiosos e ateus que odeiam atos homoafetivos e consideram os africanos uns amaldiçoados, mas isso não representa o movimento da sociedade como um todo. As pesquisas na maioria dos países do Ocidente (inclusive o Brasil) não dizem isso. E, mais importante, para além do aspecto democrático dessas auscultações, há de haver princípios de direitos inegociáveis, como é o direito de igualdade de respeito e de oportunidades. É simplesmente grotesco que um religioso que fala em tom tão fanático se eleja presidente de uma comissão que deveria proteger os que têm carência de respeitabilidade e de oportunidades.

(...) Será que o Brasil, além do mini-PIB, terá que passar agora por papagaiadas como essas?"