Quando se fala em “filmes de Charles Chaplin”, naturalmente são evidenciados os grandes clássicos como: Luzes da Cidade, Tempos Modernos, O Grande Ditador, entre outros. Entretanto, figura entre essas grandiosas e inesquecíveis produções, apesar de pouco conhecido, um filme que merece ser inserido entre as obras de arte de Chaplin: Um Rei em New York, penúltimo filme do artista e último em que atua.
Apesar de ter assistido à quase todos os filmes de Chaplin, adiei por muito tempo a exibição deste filme. Não saberia identificar, no momento, um motivo plausível, mas certamente, após assisti-lo, fui tomado por um sentimento de arrependimento por não o ter visto antes.
Os mais curiosos sobre a história do cinema e a vida e obra de Chaplin – um dos maiores artistas da sétima arte – sabem como foi traumática a sua repentina “expulsão dos EUA”, quando teve seu passaporte invalidado, acarretando um exílio que durou até o fim da sua vida, em Vevey, na Suíça. O filme Um Rei em New York (1957), foi o primeiro realizado por Chaplin fora dos EUA, sendo considerado pela imprensa como uma resposta dele ao país que o adotara em 1914. A reposta viria após uma longa perseguição do FBI, iniciada no governo McCarthy, de total caça às bruxas àqueles que tivessem alguma ligação com o comunismo. Chaplin foi investigado duramente, por seus constantes discursos à imprensa, considerados pelo FBI como antiamericanos. E foi por esse motivo, mesmo nunca tendo assumindo tal posição política, que Chaplin foi impedido de voltar aos EUA.
Mas se Chaplin não era comunista (como nunca foi provado), em Um Rei em New York ele também não tem a intenção de desmentir as autoridades estadunidenses. Durante todo o filme, observamos um humor ácido, uma sucessão de críticas indiretas – e diretas – ao modo americano de ser e de vivier.
O filme conta a história do Rei Shahdov, que após uma revolução em seu país, é exilado nos Estados Unidos da América. A primeira notícia que obtém é que a sua fortuna não mais está em seu nome e, logo depois, fica sabendo que um dos seus inferiores havia fugido com ela.
Ao desembarcar nos EUA, o rei (Chaplin) é abordado por um repórter, que pede para que ele deixe uma mensagem para o povo americano. Nesse momento, já percebemos como será o teor do filme:
Estou bastante comovido com essa hospitalidade. Essa grande nação já mostrou sua nobre generosidade com os que buscam refúgio contra a tirania.
Mas de qual hospitalidade Chaplin refere-se? Certamente não faz referência à conjuntura da época (anos 50), em que foi praticamente convidado a se retirar da ex-colônia inglesa. Chaplin está remetendo-se há 40 anos atrás, onde foi recebido de braços abertos pela nação de Lincoln, onde adquiriu fama e fortuna. Mas parece que isso não foi suficiente para que o mesmo permanecesse por lá.
O rei Shahdov é recebido em terras estadunidenses com entusiasmo. O público o idolatra. Ele participa de jantares, como convidado de honra e, sondado pela indústria da publicidade, gera lucro para os empresários. Impossível não refletir, a partir do filme, sobre como Chaplin concebia o comportamento da sociedade americana, uma sociedade do espetáculo, envolvida completamente com o mercado da propaganda e publicidade. O próprio rei, tendo que trabalhar para se sustentar, vê-se obrigado a submeter-se a uma cirurgia plástica, em nome de uma boa aparência diante das câmeras.
E diante de um mundo mergulhado no capitalismo triunfante, surge uma criança com ideias contrárias ao sistema, chamado Rupert Macabee, interpretado pelo filho de Charles, Michael Chaplin. A atuação do garoto não é tão brilhante como a de Jack Coogan, em O Garoto, mas o roteiro elaborado por Chaplin, reproduz em Michael a própria figura do pai, ao falar sobre questões políticas e ideológicas adotadas por ele (leia a autobiografia “Minha Vida). No filme há uma passagem memorável, onde Chaplin e seu filho (no caso, o rei e o pequeno Rupert) discutem sobre política:
Rei: O que você está lendo?
Rupert: Karl Marx.
Rei: Você é comunista?
Rupert: Tem que ser comunista para se ler Karl Marx?
Rei: É uma resposta Sensata. O que você é então?
Rupert: Não sou nada. Detesto todas as formas de governo.
Rei: Alguém tem que comandar.
Rupert: Não gosto dessa palavra.
Rei: Nesse caso, digamos governar.
Rupert: O governo é o poder político que somente é uma forma legal de oprimir o povo!
(…)
Rei: Meu caro amigo, a política é necessária…
Rupert: São regras impostas ao povo!
Rei: Neste país as regras não são impostas, são desejadas pelos cidadãos livres.
Rupert: Viaje um pouco e verá se são livres.
(…) Vivem todos em camisas de força: sem passaporte, nem podem se mexer!
Tornaram-se uma arma política dos opressores! Se não pensarmos como eles, nos tiram o passaporte! Sair de um país é como fugir da prisão!
(…)
Eu posso viajar?
Rei: Claro que pode.
Rupert: Só com passaporte.
O roteiro de Um Rei em New York demorou 2 anos para ser concluído. Vivendo em outro país, Chaplin teve que repensar a forma como realizaria o filme, incluindo uma nova equipe e um novo estúdio. A história é ambientado nos EUA e, evidentemente sendo impossível que sua filmagem fosse feita por lá, escolheu filmar em Londres, nos estúdios da Attica Film Company. Como era previsível, o filme não pode ser lançado nos EUA, também não tendo sucesso de público. Certamente deve ter incomodado Chaplin, entretanto, não apaga o valor simbólico que o filme tornou-se em sua carreira. Ao final, chaplin diz para Rupert:
Espero que isso acabe logo. Todos esperamos. Não é nada para se preocupar.
E seu objetivo foi cumprido: Eis a sua resposta de Charles Chaplin aos EUA, através de algo que sempre fez com maestria: Cinema.
Hallyson Alves
Filmografia
Aqui estão listados todos os filmes de Charles Chaplin, desde 1914, conforme o IMDB (imdb.com). Alguns títulos estão disponíveis para download (apenas divulgamos os links que encontram-se em sites públicos).
De: Blog Chaplin <donotreply@wordpress.com>
Assunto: Daily digest for 04/02/2013
Para: sulinha3@yahoo.com.br
Assunto: Daily digest for 04/02/2013
Para: sulinha3@yahoo.com.br