Dá para imaginar que um vaso de plantas já pode ter sido, um dia, uma calça jeans? Pois este é um ótimo (e real) exemplo de economia circular - ou seja, aquele modelo de produção em que os materiais são sempre reutilizados. E que acontece dentro da Leroy Merlin, gigante varejista no setor de soluções para a casa.
Para fazer os vasos da coleção Renova Jeans, a empresa se uniu a artesãos, cooperativas e investiu em tecnologia. Os jeans dos uniformes dos colaboradores, que já não estão mais em condições de uso e iriam para o lixo, são desmanchados em fibras, encaminhados a uma massa biotecnológica à base de borracha de seringueira, e depois moldados. Esses novos vasos, mesmo depois de descartados, podem ser reciclados infinitamente.
A companhia também reaproveita restos de uniformes não utilizados para a confecção de cobertores, que são destinados à população vulnerável. Estes uniformes velhos, aliás, se transformarão, em breve, em uniformes novinhos: a empresa está em fase de testes de uma nova tecnologia para reaproveitamento total destas peças.
Outro projeto da Leroy é o chamado Areia Circular. A iniciativa pega restos de cerâmica que sobram das lojas e encaminha para a produção de areia usada na construção civil. Esta ação já reciclou mais de 14 mil quilos de material e impediu o desvio de mais de 1.750 pisos para aterros sanitários.
"Existem oportunidades imensas dentro dos negócios circulares, que vão muito além do aproveitamento de resíduos ou de produtos que podem ser reparados e recuperados. Trata-se de uma tendência e de uma necessidade do mercado", afirma Andressa Borba, diretora de Impacto Positivo da Leroy Merlin.
A executiva fala, a seguir, sobre estas tendências de mercado e como a economia circular é uma interessante estratégia de negócios cravada em todas as decisões da empresa que foi pioneira na coleta seletiva e na gestão de resíduos no país.
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Ecoa: Por que o setor varejista precisa ir além da reciclagem?
Andressa Borba: No nosso mercado existe, por um lado, escassez de matéria-prima. Por outro lado, muita sobra de resíduos. Então, para essa conta fechar, é preciso aproveitar estas sobras e é isso que temos feito sempre que enxergamos uma oportunidade. Desde o processo de concepção dos produtos, incentivamos que eles aceitem um reaproveitamento de insumos na cadeia produtiva, seja para um mesmo produto, ou para outros, em novos formatos.
Ecoa: Quais são as principais sobras das lojas?
Andressa Borba: O entulho é um resíduo ainda muito gerado, seja no fundo de loja, ou pelas obras dos clientes. Fizemos, então, uma parceria e vimos que seria possível, por exemplo, transformar aquilo que seria um resíduo numa areia de construção, que retorna às prateleiras para ser comercializada com qualidade, além de dar acesso também a quem não pode comprar outros tipos de areia. Investimos muito também para aumentar a circularidade dos produtos têxteis, gerados pelos uniformes da companhia que são descartados porque não têm condições de uso. Temos vasos sendo vendidos nas lojas que vieram das calças jeans dos uniformes.
Ecoa: A circularidade está no centro da estratégia de resíduos da Leroy?
Andressa Borba: Sim. Buscamos, de forma constante, a redução da geração de resíduos, com aumento da eficiência operacional, o reuso de materiais, a reciclagem, a busca por novos modelos de negócio e a destinação de, no mínimo, 90% dos resíduos gerados fora de aterros sanitários até 2026. Investimos também em inovação. Em 2023, por exemplo, reestruturamos o Projeto Postera, e desenvolvemos uma iniciativa-piloto para que os uniformes pudessem ser transformados novamente
em fios de tecido, destinados à fabricação de novos uniformes ou acessórios, como bolsas utilitárias para os colaboradores.
Ecoa: Qual a importância de ações como estas para a saúde do negócio?
Andressa Borba: Entendemos que trata-se de uma necessidade quando a gente fala do nosso mercado. É preciso olhar para a economia circular como uma oportunidade. Um exemplo é um novo projeto, também em fase de testes, chamado Quase Perfeitos, em que vendemos itens com pequenos defeitos com preços mais baixos. Além de aproveitar os produtos, você gera acessibilidade de compra. Estamos também com um projeto de reparação. Então, não é apenas falar sobre reciclagem, diminuição de resíduos, mas também sobre contribuir para que mais pessoas consigam ter em casa produtos a preços mais baixos. Estamos vivendo uma nova forma de fazer negócios e quem não estiver alinhado a isso vai perder mercado.