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23 janeiro, 2025

Dicas culturais da revista piauí

 

Clássico da literatura nacional, Vidas Secas já inspirou filmes, novelas, pinturas, peças teatrais, ensaios e cursos acadêmicos. Publicado em 1938, o livro de Graciliano Ramos segue influenciando novos autores dispostos a explorar as experiências da família de Fabiano e Sinhá Vitória descritas na obra. É o caso de Árido: histórias de outras vidas secas, publicado em outubro passado pela editora Rocco.

Em cinco contos de escritores nacionais contemporâneos, o livro apresenta histórias que se passam nos dias atuais, mas dialogam com o Brasil complexo e opressor narrado por Graciliano Ramos há quase nove décadas. Os escolhidos foram Ana Paula Lisboa, Cristhiano Aguiar, Fabiane Guimarães, José Falero e Tanto Tupiassu (pseudônimo de Fernando Gurjão Sampaio), que adaptaram o texto original às suas respectivas regiões. 

As narrativas escancaram os sofrimentos, inquietações e angústias dos retirantes do século XXI. Em Sítio Ruim , de Cristhiano Aguiar, Emanuel está se descobrindo enquanto mulher trans. Em Chuva Lenta , Tanto Tupiassu descreve a aflição e o desespero ao ver uma casa ribeirinha sendo invadida e levada pelas águas. Já Fabiane Guimarães, no primeiro conto do livro, mostra como o avanço tecnológico pode ajudar a deteriorar as relações humanas. 

Árido expõe um Brasil moderno, mas ao mesmo tempo atrelado a estruturas arcaicas. Um país marcado pela violência, pobreza e desigualdade, as mesmas mazelas presentes na vida de Fabiano e Sinhá Vitória. Assim, o novo livro, além de um tributo, é também um alerta.

O documentário Dahomey acompanha a viagem de 26 relíquias de Paris até Benim (antigo reino de Daomé), na África. As obras, saqueadas pelas tropas coloniais francesas no século XIX estavam no Museu do Quai Branly, com peças de arte de povos da África, Ásia, Oceania e Américas. Entre as relíquias devolvidas a eles, destacam-se um imponente trono de madeira decorado em alto relevo e estatuetas zoomórficas em tamanho real.

Para mostrar o retorno dos tesouros, a diretora francesa Mati Diop, cuja família é de origem senegalesa, acrescenta um elemento imaginário à realidade documentada. O papel de destaque no filme é dado a uma estátua que representa Ghézo, o rei de Daomé entre 1818 a 1859, mas que no Quai Branly era identificado apenas com o número 26. 

Em uma narração dramatizada, o escritor haitiano Makenzy Orcel dá voz à estátua, como se o espírito do rei contasse sua própria história, desde as memórias que guarda de sua terra natal ao tempo que passou sendo exibido no museu de Paris. “Será que eles [os beninenses] ainda se lembram de mim?”, questiona, a voz do rei Ghézo.

A decisão de ficcionalizar o relato é questionável – principalmente as primeiras frases, que soam exageradamente teatrais –, mas cumpre o papel de guiar o espectador pelas nuances dessa viagem de retorno e seu significado. O texto falado restringe-se a essa estátua, cuja viagem para Benim é acompanhada pela cineasta desde o seu empacotamento no museu até a recepção de gala com que é recebida no país de origem. 

A primeira parte do documentário não apresenta reflexões de nenhum especialista, curador ou pesquisador. A maior vantagem dessa escolha narrativa é poder conduzir o espectador de maneira sutil a uma série de questionamentos complexos sobre as várias dimensões da violência colonial e sobre o direito à repatriação de bens culturais. Essa parte inicial também cumpre o papel de nos preparar para a segunda metade  – mais ágil e instigante.

A diretora apresenta, então, uma discussão de estudantes da Universidade de Abomey-Calavi. Sentados em círculo, eles debatem o significado de ter aqueles bens de volta em seu país, apesar de muitos não conseguirem desenvolver nenhuma relação com a antiga cultura iorubá. Inicia-se uma discussão sobre como interpretar esse retorno.

Alguns alunos criticam a devolução de apenas 26 dos 7 mil objetos etnográficos mundiais catalogados na França (mais de cem artefatos do próprio Benim ficaram de fora da restituição). Acham mais adequado continuar a cobrar os objetos que ainda estão em posse dos franceses. Uma estudante de cinema, por outro lado, argumenta que os colegas deveriam estar comemorando a conquista histórica. Há um impasse sobre qual o passo seguinte. Denunciar o comportamento colonialista do museu francês em manter parte das obras? Agradecer ao presidente Macron pela sua “generosidade”, ao devolver as peças com pompa e circunstância? Celebrar a volta das 26 obras junto ao presidente do Benim? 

Felizmente, Dahomey – que ganhou o Urso de Ouro do Festival de Berlim do ano passado – não tem pretensão de oferecer uma resposta definitiva, nem apontar culpados. Seu maior mérito é ampliar os limites da discussão, seja no caso específico do Benim, seja no de vários outros países, como o Brasil, que ainda têm contas a acertar com museus europeus. Cabe a cada um de nós decidir o que fazer a partir de agora. 

Na entrada do Museu de Luxemburgo, em Paris, um pequeno outdoor anuncia a exposição Tarsila do Amaral - Painting Modern Brazil. Com curadoria da italiana Cecilia Braschi, reúne mais de 150 obras e ficará em cartaz até 2 de fevereiro. A exposição, realizada em uma das alas do Palácio de Luxemburgo, foi pensada de forma entrecortada e os ambientes são pequenos. Trata-se de uma retrospectiva. Do início da carreira de Tarsila, chama atenção Estudo de nu (sentado), pintado quando ela ainda estudava na Academia Julian, em Paris. A perspectiva rígida e academicista apreendida na escola logo seria subvertida por Tarsila, que adotaria como mestres os cubistas Albert Gleizes (1881-1953) e Fernand Léger (1881-1955). 

Ao observar Estrada de Ferro Central do Brasil (1924), é impossível não notar a influência de Léger no quesito composição. Em Cartão postal (1928) é visível a maneira como a artista brasileira assimilou e reinventou a ideia de volume de modo singular. 

A exposição inclui clássicos de Tarsila, como Operários (1933), Cuca (1924) e Autorretrato – Le manteau Rouge (1923). Mas há desfalques importantes, como Abaporu (1928), que pertence ao Museu de Arte Latino-Americana de Buenos Aires (Malba) e A Lua (1928), incorporada ao acervo do Museu de Arte Moderna de Nova York (MoMA). 

Para o público europeu, que teve pouco contato com a obra da artista, a mostra apresenta um recorte original de sua produção. Mas para quem viu a exposição Tarsila popular, realizada no Museu de Arte de São Paulo (Masp) em 2019, não há muitas novidades. 

Ao final da visita, o visitante brasileiro tem um gosto agridoce. Por um lado, sente orgulho pelo reconhecimento de Tarsila na Europa. Por outro, reconhece certo cinismo. A França, no esforço de se atualizar, adotando agora a visada decolonial, volta à mesma personagem que, nos 1920 e 1930, transitou por Paris sem obter reconhecimento.

Na edição de janeiro da piauí, o editor Armando Antenore explica o que são os “pôsteres de boas maneiras”, batizados de manā posutā, que adornam estações, trens e metrôs da rede ferroviária no Japão. Engenhosos e coloridos, os cartazes exibem recomendações de como os passageiros devem se comportar. As sugestões pretendem garantir o conforto das viagens, aumentar a segurança e manter o transporte pontual. Os primeiros desenhos surgiram no reinado do imperador Taishō (1912-26), mas só se tornaram habituais nos anos 1970. Entre os temas que abordam, destacam-se o manuseio de bagagens, o uso de celulares e tablets, o descarte de lixo, a postura nos assentos e a modulação da voz durante as conversas. A ideia é educar pelo bom humor e pelo lirismo.

Ilustração_Seibu_Railway_2016

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