A
Copa do Mundo chegou ao fim. Os noticiários, as rodas de conversa e o
planeta da bola não param de celebrar a grande campeã desta copa, dentro
e fora de campo. A Alemanha alternou entre bom desempenho e vitórias
convincentes nos gramados com shows fora de campo ao longo de toda a sua
estadia no Brasil. Nos noticiários esportivos, a bola da vez é a
pequena revolução que o país realizou nas estruturas do futebol desde o
fracasso na Copa de 2002, em que perdeu a final para o Brasil após uma
campanha pouco convincente. Mas as reformas estruturais que culminaram
com o grande título conquistado, celebrado como a competência de uma
nação organizada que colhe os frutos de seu planejamento de longo prazo
não é por acaso [veja mais],
são reflexo da forma como agem os alemães em quase todas as áreas de
sua sociedade. Ao contrário do Brasil, a Alemanha, efetivamente, faz
gols, faz escolas, faz hospitais e também produz energia limpa, recicla
seu lixo e educa seus cidadãos.
Quarta
maior economia do mundo, sendo a maior da Europa, a Alemanha se recriou
após a queda do muro de Berlim com sólidos resultados nas áreas social e
ambiental, se tornando uma das campeãs mundiais em sustentabilidade.
Desde 2002 o governo se baseia em uma Estratégia Nacional para o
Desenvolvimento Sustentável, com vistas a alcançar a equidade entre as
gerações, a qualidade de vida, a coesão social e a responsabilidade
internacional, produzindo relatórios bianuais com base em indicadores-chavede
mais de 20 áreas. Os resultados indicam que o país tomou um caminho sem
volta e se consolida, ano a ano, na vanguarda da responsabilidade
socioambiental.
Quando
o assunto é energia alternativa, cuja produção impõe menores impactos
socioambientais, a Alemanha é líder absoluta com a maior produção de
energia solar do mundo e a segunda maior potência instalada em energia
eólica [1](acaba de ser ultrapassada pela China). Apenas com a força dos ventos [2]o
país é capaz de produzir 35 GW/ano, cerca de três vezes a capacidade
instalada do gigantesco e altamente impactante projeto da UHE Belo
Monte, no Pará. No caso da energia solar não existem rivais para os
alemães, produtores de 35% de toda a energia do mundo, e parte do
sucesso pode ser explicado por uma forte política de incentivos à
produção descentralizada, onde empresas e casas já contam com cerca de
1,4 milhão de sistemas fotovoltaicos instalados. A meta é quadriplicar a
produção até 2020, chegando a 20% da demanda energética do país, que
tem bem menos da metade da insolação brasileira.
Bairro que utiliza energia solar na Alemanha. Fonte: Ciclo Vivo. |
Outro
assunto em que a Alemanha é campeã é a mobilidade urbana. Na capital,
Berlim, é possível chegar a qualquer lugar da cidade de bicicleta. A
malha cicloviária já ultrapassa os 1.000 km, cerca de quatro vezes mais
que São Paulo, tendo um terço do tamanho da metrópole brasileira.
Estima-se que para cada carro alemão existam 1,5 bicicletas [veja mais],
mesmo o país sendo berço de várias das maiores montadoras do mundo. A
segunda maior cidade do país, Hamburgo, vai além: cansada de ver os
automóveis como principal meio de transporte urbano, um projeto planeja
eliminar a necessidade de carros na cidade em 20 anos, com a exclusão do
acesso de veículos a áreas específicas e a criação de um conjunto de
rotas verdes que permitam o deslocamento por bicicletas e a pé [3].
Cresce a importância das bikes em Berlim. Fonte: Trilhas BR. |
Separar
o lixo doméstico também é um hábito do país tetracampeão. A Alemanha é o
país que mais recicla lixo no planeta, em conjunto com a vizinha
Áustria chegam a reciclar mais de 60% do total de lixo, tendo mais que o
dobro da média de seus vizinhos europeus e pelo menos 12 vezes mais que
a cidade de São Paulo. Seu sistema de reciclagem é dividido entre
papéis, orgânicos, recicláveis comuns (alumínio, vidros, metais) e não
recicláveis, e é obrigatório a todo cidadão que faça a separação desde a
década de 1990 [4].
Os alemães pagam tarifas diferenciadas de acordo com a quantidade e
qualidade do lixo produzido, sendo mais caro dispor resíduos não
recicláveis, o que acaba por estimular o consumo consciente. A última
questão a ser resolvida em relação aos resíduos urbanos é a alta taxa de
incineração de materiais não recicláveis [5],
que chega a mais de 20% de todos os resíduos produzidos - não existem
aterros no país, e apenas materiais altamente tóxicos são descartados
após condicionamento especial.
Os tonéis de cores diferentes numa rua de Berlim: reciclagem virou mania nacional. |
Não
é à toa que os representantes do país que tem o quinto melhor índice de
desenvolvimento humano do mundo deram um show ao longo de toda sua
visita ao país. Para quem se acostuma desde cedo a fazer o dever de
casa, suas ações são naturais e chocam quem não está acostumado [veja mais].
A dança com os índios pataxós, em meio à celebração dos 36 anos de
Miroslav Klose soam estranhas quando consideramos o descaso com que o
Brasil vem tratando suas populações indígenas, fator que se agrava dia
após dia pelas pressões da bancada ruralista no Congresso e o descaso do
governo federal [veja mais].
Os alemães foram além, doaram 10 mil euros aos Pataxós baianos e, ao
redor da recém conquistada taça do mundo, fizeram a tradicional dança
que aprenderam nos rituais indígenas. Que seu respeito e simpatia para
com os índios, normalmente muito mais valorizados por estrangeiros que
pelos próprios brasileiros, sirvam de exemplo tanto quanto a experiência
da cidade mais sustentável do mundo, Freiburg, [veja mais] e os inúmeros bons índices de sustentabilidade germânicos.
"Quem
gasta sistematicamente mais do que produz vive à custa das gerações
vindouras e compromete o futuro" – Angela Merkel, 2012.
[1] Fonte: EcoD
[2] Fontes: Revista Ecológica, Revista Exame, DW Notícias.
[3] Fonte: Instituto Carbono Brasil.
[4] Fonte: DW Notícias.
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