12 agosto, 2013

Lavagem de Dinheiro no Futebol by Fernando Nogueira da Costa

Futebol como Lavanderia de Dinheiro Sujo
Fernando Mello (FSP, 14/07/13) informa que os clubes de futebol do Brasil movimentaram US$ 2 bilhões (R$ 4,52 bilhões) nos últimos dez anos com compra e venda de atletas ao exterior. Parte desses negócios passou por paraísos fiscais ou por países que integram a lista de suspeitos de apoiarem o terrorismo. A falta de informações também marca parte desses contratos. Entre janeiro de 2002 e dezembro de 2012, foram registradas 4.818 negociações de compra e venda de atletas, de acordo com dados inéditos obtidos pela Folha com o Banco Central, por meio da Lei de Acesso à Informação.
Do total negociado nestes dez anos, cerca de US$ 190 milhões foram com paraísos fiscaisou países que integram a lista do Conselho de Segurança das Nações Unidas referente ao combate ao financiamento do terrorismo, como a Coreia do Norte.
Todo dinheiro resultante da negociação de um atleta com o exterior precisa ser registrado no BC.
Os contratos apresentam informações sobre a origem do dinheiro, quando um jogador é vendido para o exterior. Ou o destino da verba, quando um clube nacional contrata alguém de fora.
Segundo os dados do BC, os clubes brasileiros negociaram US$ 14 milhões com as Ilhas Virgens e as Ilhas Virgens Britânicas, dois dos mais famosos paraísos fiscais do mundo. Com as Bahamas, foram duas negociações, que somaram US$ 6,7 milhões.
Com a Suíça, foram outros US$ 37,5 milhões. O Atlético-MG, por exemplo, comprou em 2011 os direitos de Guilherme por US$ 6,7 milhões, a quarta maior negociação da história do futebol brasileiro.
O jogador pertencia a um time da Ucrânia, mas o dinheiro foi pago a uma empresa suíça. Segundo o clube, “o valor foi depositado na conta e local indicados conforme contrato da negociação”.
Entre 2006 e 2007, o Palmeiras fez duas compras no Chipre, também considerado um paraíso fiscal, totalizando US$ 7,4 milhões. Entre 2009 e 2011, o Corinthians fez dez negociações com uma empresa do Panamá, totalizando US$ 2,1 milhões.
Há ainda casos de contratos “fantasmas”, nos quais as transações envolvendo clubes no exterior foram registradas como “não informadas” no BC.
Técnicos dizem que os dados estão arquivados, apenas não podem ser extraídos por um problema de informática. O banco não respondeu até a conclusão desta edição.
As negociações internacionais envolvendo o futebol passaram a chamar a atenção das autoridades mundiais.
Gafi, órgão internacional de combate à lavagem de dinheiro, produziu um relatório, em 2009, explicando como o futebol se tornou um alvo prioritário global para a lavagem de dinheiro de crimes.
Segundo o órgão, entre as práticas mais comuns em países como o Brasil estão o investimento de dinheiro sem origem definida em um time com dificuldades financeiras, vindo do tráfico de drogas, de armas ou simplesmente destinado a, depois de “esquentado”, corromper os que “têm destaque político no país”.
O Gafi listou características do futebol que facilitam a lavagem, entre elas o fato de que:
  1. os preços podem apresentar forte oscilação; a pouca ou nenhuma regulamentação ou fiscalização;
  2. a difícil avaliação quanto ao preço e à qualidade dos jogadores negociados e
  3. os poucos casos de punições de clubes, atletas e outros envolvidos.
Para Mauro Salvo, autor de “Lavagem de Dinheiro no Futebol Brasileiro” – um dos poucos estudos acadêmicos sobre o tema no país -, a prática é mais “profunda e complexa” do que se pensava.
“As transferências são realizadas em todo o mundo, proporcionando amplas oportunidades de lavagem. Além disso, o esporte é essencialmente caracterizado por um elevado grau de imprevisibilidade sobre resultados, o que pode levar a um aumento da tolerância aos pagamentos aparentemente irracionais“, disse o economista.
Desde 2002, o Banco Central multou 21 clubes por falta de registro das operações de câmbio relativas à compra e venda de atletas no exterior. O total de punições atingiu US$ 20 milhões.
Há casos em que o BC não identificou relação entre pagamentos e clubes que supostamente fizeram os contratos. É o que ocorreu em caso julgado em 2011 que apontou “operação ilegítima, falta de trânsito dos recursos financeiros por estabelecimento autorizado e lesão às reservas cambiais do Brasil”.
Segundo o BC, a Ponte Preta fez contrato de empréstimo de Régis Fernandes para o Kyoto Purple, do Japão, mas não há registro da operação de câmbio referente ao ingresso do dinheiro no Brasil. Pelo levantamento do BC, todo o dinheiro repassado para a Ponte foi depositado por várias pessoas físicas e jurídicas, “dentre os quais não se encontrou nenhum depósito efetuado pelo Kyoto Purple”.
Em sua defesa, a Ponte disse que “recebeu, regularmente, em reais, o valor do empréstimo do jogador, inexistindo qualquer prova de que os recursos ingressaram no país de forma irregular”. Foi considerada infração de câmbio ilegítimo e aplicada multa de US$ 250 mil.
Em 2010, o Coritiba foi multado em US$ 1,4 milhão pela negociação de dois jogadores com times do México e de Portugal. O BC apontou que não houve registro de nenhuma operação de câmbio formal.
Auditores apontaram “discrepâncias nas assinaturas atribuídas às mesmas pessoas” e “forma inusual” de depósitos. O Coritiba disse que as partes mudaram a negociação para pagamento em moeda nacional. A justificativa não foi aceita.


De: Cidadania & Cultura < donotreply@wordpress.com >


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