01 agosto, 2013

ETERNO: CURT SWAN (1920-1996): FORTALEZA DA SOLIDÃO

 
    Há um antes e um depois de Curt Swan nas histórias do Homem de Aço. Ao longo de mais de trinta anos, a sua arte fez as delícias de várias gerações de fãs. Ele, no entanto, considerava-se menos um artista do que um operário.
 
 
 
 
     Nascido na pequena cidade de Wilmar (no estado norte-americano do Minnesota) a 17 de fevereiro de 1920, Douglas Curtis Swan, de seu nome completo, era o mais novo dos cinco filhos do casal John Swanson e Leotine Hanson. O pai trabalhava nos caminhos-de-ferro e a mãe no hospital local.
      De origem sueca, o apelido Swanson fora abreviado para Swan pela avó paterna de Curt em finais do século XIX quando os seus antepassados ainda viviam no Canadá. 
      À medida que crescia, o pequeno Curt admirava as tiras ilustradas publicadas em jornais como o Saturday Evening Post, tendo desde tenra idade evidenciado talento para o desenho. Na escola, os seus dotes artísticos eram frequentemente requisitados tanto por colegas como por professores. Porém, apenas em sonhos ele acreditava um dia poder ganhar a vida a desenhar.
      Terminado o liceu, Curt começou a trabalhar num armazém para ajudar a família a enfrentar a Grande Depressão que assolava os EUA. Aos 18 anos alistou-se na Guarda Nacional do Minnesota, tendo sido incorporado no Exército dois anos depois.
      Corria o ano de 1941 quando a Companhia de Infantaria em que estava integrado foi destacada para a Irlanda do Norte, no âmbito da II Guerra Mundial.  Uma vez mais graças ao seu talento como ilustrador, Curt teve mais sorte do que a grande maioria dos seus camaradas de armas, mobilizados para combater em Itália e no Norte de África. Ao invés disso, Curt passou a maior parte do conflito a trabalhar como desenhador no boletim militar Star and Stripes. Período em que conheceu o escritor France Herron do qual se tornou amigo e que, anos depois, o ajudaria a arranjar emprego na DC Comics.
 
 
      Em finais de 1943, Curt foi transferido para Paris, onde arrendou um pequeno apartamento perto da Torre Eiffel. Vivendo o sonho de qualquer artista, decidiu casar no ano seguinte com Helene Brickley, uma trabalhadora da Cruz Vermelha também ela estacionada na capital francesa. O casal havia-se conhecido anos atrás, num baile em Fort Dixon, Nova Jérsia.
      Depois da guerra, o jovem casal regressou aos EUA. Curt ambicionava obter um emprego como ilustrador e, nesse sentido, trocou o seu Minnesota natal por Nova Iorque, onde disporia de maiores oportunidades profissionais. 
      Por sugestão do seu amigo France Herron - que entretanto retomara o seu emprego como argumentista na DC - Curt enviou algumas amostras do seu trabalho a um dos responsáveis da editora. Causou tão boa impressão que não tardou a ser convocado para uma entrevista de emprego. Admitido como desenhador, foi-lhe fornecido um argumento para uma história de Boy Commandos. Por cada página desenhada, Curt receberia 18 dólares, uma excelente maquia para os valores da época. Curt, no entanto, acreditava que aquele seria um bom emprego apenas durante um ou dois anos, pois não antevia grande futuro para a indústria dos quadradinhos. Estava portanto longe de imaginar que trabalharia no ramo ao longo de mais de 40 anos.
 

 
      À parte algumas aulas noturnas no Instituto Pratt (uma instituição privada de ensino superior com uma forte tradição nas artes), no âmbito de uma programa de reintegração social de veteranos da II Guerra Mundial promovido pelo Governo dos EUA, Curt era, acima de tudo, um autodidata. Por conseguinte, embora o salário que auferia na DC fosse apelativo, só então percebeu a enorme quantidade de tempo de que necessitava para ilustrar cada página.
      À semelhança de muitos outros artistas novatos, Curt colocava muitos detalhes no seu trabalho, ficando desiludido quer pelo pouco material que conseguia produzir, quer pelo aspeto do mesmo depois de colorido.
      Graças às dicas de Steve Brody, um colorista veterano da DC, Curt aprendeu a deixar os pormenores a cargo dos arte-finalistas. Logo começou a produzir três a quatro páginas por dia, chegando a ganhar perto de dez mil dólares ao longo de seu segundo ano ao serviço da editora.
      Cada vez mais solicitado, Curt assumiu a arte de vários títulos da DC, dispendendo entre 14 a 16 horas diárias de trabalho, sete dias por semana. A dada altura, passou também a desenhar as capas de Superboy. Começou assim a sua longa relação com os títulos do Último Filho de Krypton, cuja primeira história por si ilustrada foi publicada em Superman nº51 (abril de 1948).
     Mas nem tudo foram rosas. Os seus recorrentes desentendimentos com Mort Weisinger - à época editor dos títulos do Homem de Aço - levaram Curt a abandonar a DC em 1951 para ir trabalhar numa agência publicitária. Uma experiência malsucedida e fugaz, na medida em que, um mês volvido, Curt retornou à DC, depois de concluir que o modesto salário de 50 dólares semanais que auferia na referida agência não lhe permitia pagar as contas no fim do mês.
 
As cenas de voo do Super-Homem tornaram-se mais dinâmicas graças à arte de Curt Swan.
 
     Recebido de braços abertos pelos seus antigos colegas e superiores, Curt regressou ao trabalho. Porém, também as suas enxaquecas voltaram. Como durante o mês em que estivera afastado de Mort Weisinger não fora acometido por elas, Curt concluiu que estavas resultavam da tensão acumulada pelas constantes críticas de Weisinger ao seu trabalho. Resolveu então confrontá-lo e dizer-lhe o que pensava. Para seu espanto, Weisinger respondeu favoravelmente e as enxaquecas de Curt desapareceram como que por magia.
     Em 1952, Curt foi pontualmente chamado a substituir o desenhador principal das histórias do Super-Homem. Como já vinha ilustrando os títulos Superboy Jimmy Olsen, pareceu-lhe uma extensão natural do trabalho até aí desenvolvido.
     Três anos depois, na sequência da saída do seu predecessor, Curt assumiu a arte do Homem de Aço.  A pedido de Weisinger, alterou o visual do herói, suavizando-lhe o queixo de lanterna e acentuando-lhe os músculos, de molde a torná-lo menos caricatural.
     Através do traço de Curt, as expressões faciais do Super-Homem humanizaram-se e as suas cenas de voo tornaram-se mais fluidas - e até mesmo graciosas. Para esse efeito, tomou como modelos os atores Johnny Weissmuller ( o mítico Tarzan cinematográfico  dos anos 1930 e 1940) e George Reeves (que deu vida ao herói kryptoniano na não menos lendária série televisiva da década de 1950).
 Johnny Weissmuller (dir.) e George Reeves serviram de modelo ao Super-Homem idealizado por Curt Swan.
 
Pelo traço de Curt Swan, as expressões faciais do Super-Homem humanizaram-se.
 
     Quando, em meados da década de 70 do século passado, a DC e a Warner Bros. decidiram transpor pela primeira vez o Homem de Aço ao cinema, foi no visual do herói desenvolvido por Curt Swan que Christopher Reeve se baseou para a sua abordagem à personagem.
     Até 1986, ano em que foi substituído por John Byrne na arte das histórias do Super-Homem, Curt Swan revelou-se um artista consistente e prolífico, tendo colaborado ao longo dos anos com um extenso rol de argumentistas, arte-finalistas e editores, unânimes em reconhecer o seu talento e ética profissional. Despediu-se definitivamente da personagem com Whatever Happend to the Man of Tomorrow?, uma realidade alternativa escrita por Alan Moore. Entre os seus contributos para a mitologia do Homem de Aço destaca-se a criação (em parceria com o escritor Cary Bates) do supervilão Terra-Man e do herói alienígena Vartox.
 
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Whatever Happened to the Man of Tomorrow? (1986) marcou a despedida definitiva de Curt Swan das histórias do Super-Homem.
 
 
     Nos anos seguintes, Curt continuou a trabalhar para a DC, desenhando títulos como Swamp ThingTeen Titans e vários anuais de outras personagens, apesar de reformado. Tal como muitos dos seus pares, Curt não acautelara financeiramente o seu futuro, pelo que se viu obrigado a continuar a trabalhar, em prol quer da sua sanidade mental, quer da sua sobrevivência.
     Com o tempo, porém, as suas colaborações com a DC foram-se tornada cada vez mais escassas, o que levou Curt ter problemas de alcoolismo que ditariam o fim do seu casamento.
     Quando questionado sobre a sua ética profissional, Curt invariavelmente respondia que se limitava a fazer o que qualquer operário faz: no seu caso, tudo se resumia a receber um argumento, desenhá-lo, devolvê-lo, receber o respetivo pagamento e trazer novo argumento para assim começar tudo de novo. Havia, no entanto, mais do que isso. Mesmo não se assumindo como um artista, Curt reconhecia que nada se comparava ao sorriso de um jovem enquanto folheava uma história por ele desenhada.
     Apenas em 1984 Curt foi agraciado com o primeiro prémio oficial da sua carreira, o Inkpot Award. A título póstumo, receberia também  The Will Eisner Award Hall of Fame, em 1997.
     Curt Swan morreu durante o sono a 16 de junho de 1986, deixando como legado ao mundo três filhos e a arte do Homem de Aço que encantou - e continua a encantar - sucessivas gerações de fãs em todo o mundo.
 
 
O Homem de Aço nunca mais seria o mesmo depois de Curt Swan.
 

De: FORTALEZA DA SOLIDÃO <noreply@blogger.com>
Assunto: FORTALEZA DA SOLIDÃO
Para: sulinha3@ig.com.br