04 fevereiro, 2013

Um Rei em New York: a resposta de Chaplin aos EUA

Quando se fala em “filmes de Charles Chaplin”, naturalmente são evidenciados os grandes clássicos como: Luzes da Cidade, Tempos Modernos, O Grande Ditador, entre outros. Entretanto, figura entre essas grandiosas e inesquecíveis produções, apesar de pouco conhecido, um filme que merece ser inserido entre as obras de arte de Chaplin: Um Rei em New York, penúltimo filme do artista e último em que atua.
A King in New York
Um Rei em New York – Cartaz
Apesar de ter assistido à quase todos os filmes de Chaplin, adiei por muito tempo a exibição deste filme. Não saberia identificar, no momento, um motivo plausível, mas certamente, após assisti-lo, fui tomado por um sentimento de arrependimento por não o ter visto antes.
Os mais curiosos sobre a história do cinema e a vida e obra de Chaplin – um dos maiores artistas da sétima arte –  sabem como foi traumática a sua repentina “expulsão dos EUA”, quando teve seu passaporte invalidado, acarretando um exílio que durou até o fim da sua vida, em Vevey, na Suíça. O filme Um Rei em New York (1957), foi o primeiro realizado por Chaplin fora dos EUA, sendo considerado pela imprensa como uma resposta dele ao país que o adotara em 1914. A reposta viria após uma longa perseguição do FBI, iniciada no governo McCarthy, de total caça às bruxas àqueles que tivessem alguma ligação com o comunismo. Chaplin foi investigado duramente, por seus constantes discursos à imprensa, considerados pelo FBI como antiamericanos. E foi por esse motivo, mesmo nunca tendo assumindo tal posição política, que Chaplin foi impedido de voltar aos EUA.
O Rei chega a New York.
O Rei chega a New York.
Mas se Chaplin não era comunista (como nunca foi provado), em Um Rei em New York ele também não tem a intenção de desmentir as autoridades estadunidenses. Durante todo o filme, observamos um humor ácido, uma sucessão de críticas indiretas – e diretas – ao modo americano de ser e de vivier. 
O filme conta a história do Rei Shahdov, que após uma revolução em seu país, é exilado nos Estados Unidos da América. A primeira notícia que obtém é que a sua fortuna não mais está em seu nome e, logo depois, fica sabendo que um dos seus inferiores havia fugido com ela.
Ao desembarcar nos EUA, o rei (Chaplin) é abordado por um repórter, que pede para que ele deixe uma mensagem para o povo americano. Nesse momento, já percebemos como será o teor do filme:
Estou bastante comovido com essa hospitalidade. Essa grande nação já mostrou sua nobre generosidade com os que buscam refúgio contra a tirania.
Mas de qual hospitalidade Chaplin refere-se? Certamente não faz referência à conjuntura da época (anos 50),  em que foi praticamente convidado a se retirar da ex-colônia inglesa. Chaplin está remetendo-se há 40 anos atrás, onde foi recebido de braços abertos pela nação de Lincoln, onde adquiriu fama e fortuna. Mas parece que isso não foi suficiente para que o mesmo permanecesse por lá.
O Rei e a Rainha.
O Rei e a Rainha.
O rei Shahdov é recebido em terras estadunidenses com entusiasmo. O público o idolatra. Ele participa de jantares, como convidado de honra e, sondado pela indústria da publicidade, gera lucro para os empresários. Impossível não refletir, a partir do filme, sobre como Chaplin concebia o comportamento da sociedade americana, uma sociedade do espetáculo, envolvida completamente com o mercado da propaganda e publicidade. O próprio rei, tendo que trabalhar para se sustentar, vê-se obrigado a submeter-se a uma cirurgia plástica, em nome de uma boa aparência diante das câmeras. 
O rei Shahdov, após a plástica.
O rei Shahdov, após a plástica.
E diante de um mundo mergulhado no capitalismo triunfante, surge uma criança com ideias contrárias ao sistema, chamado Rupert Macabee, interpretado pelo filho de Charles, Michael Chaplin. A atuação do garoto não é tão brilhante como a de Jack Coogan, em O Garoto, mas o roteiro elaborado por Chaplin, reproduz em Michael a própria figura do pai, ao falar sobre questões políticas e ideológicas adotadas por ele (leia a autobiografia “Minha Vida). No filme há uma passagem memorável, onde Chaplin e seu filho (no caso, o rei e o pequeno Rupert) discutem sobre política:
Rei: O que você está lendo?
Rupert: Karl Marx.
Rei: Você é comunista?
Rupert: Tem que ser comunista para se ler Karl Marx?
Rei: É uma resposta Sensata. O que você é então?
Rupert: Não sou nada. Detesto todas as formas de governo.
Rei: Alguém tem que comandar.
Rupert: Não gosto dessa palavra.
Rei: Nesse caso, digamos governar.
Rupert: O governo é o poder político que somente é uma forma legal de oprimir o povo!
(…)
Rei: Meu caro amigo, a política é necessária…
Rupert: São regras impostas ao povo!
Rei: Neste país as regras não são impostas, são desejadas pelos cidadãos livres.
Rupert: Viaje um pouco e verá se são livres.
(…) Vivem todos em camisas de força: sem passaporte, nem podem se mexer!
Tornaram-se uma arma política dos opressores! Se não pensarmos como eles, nos tiram o passaporte! Sair de um país é como fugir da prisão!
(…)
Eu posso viajar?
Rei: Claro que pode.
Rupert: Só com passaporte.
A King in NY_Rupert
O roteiro de Um Rei em New York demorou 2 anos para ser concluído. Vivendo em outro país, Chaplin teve que repensar a forma como realizaria o filme, incluindo uma nova equipe e um novo estúdio. A história é ambientado nos EUA e, evidentemente sendo impossível que sua filmagem fosse feita por lá, escolheu filmar em Londres, nos estúdios da Attica Film Company. Como era previsível, o filme não pode ser lançado nos EUA, também não tendo sucesso de público. Certamente deve ter incomodado Chaplin, entretanto, não apaga o valor simbólico que o filme tornou-se em sua carreira. Ao final, chaplin diz para Rupert:
Espero que isso acabe logo. Todos esperamos. Não é nada para se preocupar.
E seu objetivo foi cumprido: Eis a sua resposta de Charles Chaplin aos EUA, através de algo que sempre fez com maestria: Cinema.
Hallyson Alves
 

Filmografia

Aqui estão listados todos os filmes de Charles Chaplin, desde 1914, conforme o IMDB (imdb.com). Alguns títulos estão disponíveis para download (apenas divulgamos os links que encontram-se em sites públicos).
 


De: Blog Chaplin <donotreply@wordpress.com>
Assunto: Daily digest for 04/02/2013
Para:
sulinha3@yahoo.com.br
 
Sabedoria, Saúde e $uce$$o: Sempre.
http://br.groups.yahoo.com/group/Cidad3_ImprensaLivre/