23 fevereiro, 2013

Mauricio de Sousa: Perdi R$ 2 milhões


Mauricio de Sousa fala do erro que cometeu ao investir em piscicultura

MAURICIO DE SOUSA Cartunista, 77 anos, criador da Turma da Mônica   (Foto: Olga Lisloff/Folhapress)
"Sempre que algo dá errado, tendo a pensar que o erro não foi meu. Mas, no caso que conto aqui, tenho de admitir: errei. Por ingenuidade, credulidade, falta de preparo, errei.
Em meados dos anos 1980, quis aproveitar a boa água que brotava das nascentes de minha chácara em Caçapava, no Vale do Paraíba, no Estado de São Paulo. Um belo lago cheio de peixes já se formara ali. Resolvi investir em piscicultura.

Comprei uma extensão de terra que ia até um rio próximo. Estudei as variedades de peixes que poderia criar. Encomendei girinos de criadouros da Ilha Solteira. Montei um laboratório para fazer inseminação artificial nas espécies que traria de Mato Grosso. Fiz contato com jovens que moravam na região para me ajudar. Mandaria esses jovens para a Ilha Solteira e para a Chinapara estudar piscicultura. O plano de negócios previa 32 tanques, um frigorífico e uma pequena frota de furgões para levar os peixes recolhidos no fim da madrugada para as cidades próximas ao Vale do Paraíba. Queria incentivar os habitantes do Vale a incluir peixe fresco e barato em seus hábitos alimentares.

Em meus planos, ao lado dos primeiros lagos haveria um salão com um grande aquário, com todas as variedades de peixes que pretendia criar e oferecer. Os visitantes poderiam adquirir bolsas de plástico transparentes tematizadas, com dispositivos que despejavam ração e comprimidos de oxigênio. Fui até o Japão para conhecer a tecnologia dessas bolsas. Com elas, o comprador poderia ter uma espécie de aquário portátil, com peixinhos de estimação para levar para casa. Os peixes seriam batizados e passariam a ser personagens de historinhas que pretendia publicar nas revistas do Chico Bento. Os personagens virariam produtos licenciados com venda exclusiva na cidade de Caçapava. O plano movimentaria o comércio e o turismo local. No início do processo apresentei o projeto ao prefeito da cidade, que adorou a ideia.
O GIBI QUE NUNCA SAIU A capa feita por Mauricio em meados dos anos 1980, para o projeto de piscicultura (Foto: Reprodução)
Até que um dia chego a minha chácara e vejo, ao longe, o terreno que eu comprara para os tanques de criação sendo invadido. Muitos casebres estavam sendo erguidos. Fiz uma denúncia ao prefeito, que prometeu mandar fiscais para conter a invasão. Avisei que, depois de levantadas as paredes, eu não tomaria providências contra os invasores. Suspeito até hoje que eles estavam sendo comandados por alguém que conhecia o projeto. As invasões paravam no limite do meu terreno. Dias depois, voltei ao local. As construções populares tinham se espalhado. Tentei usar o contrato de compra do terreno para uma ação judicial, mas descobri que o documento estava cheio de erros que me impediam de tomar medidas legais.

Hoje percebo que fui precipitado. Assinei o contrato de compra das terras sem consultar meus advogados. Na empolgação de ver o negócio concretizado, acabei agindo por impulso, e não tomei todas as precauções necessárias. Fui ingênuo. Desmontei o projeto, esqueci os tanques, perdi algo em torno de R$ 2 milhões e uma boa ideia. Talvez um dia eu a retome, do jeito certo."
http://revistaepoca.globo.com/Sociedade/noticia/2013/01/mauricio-de-sousa-perdi-r-2-milhoes.html